segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A GRAÇA SEM FRONTEIRAS DO PALHAÇO, OS DIREITOS HUMANOS, A PAZ EM OSLO, AS INTRIGAS DA CHINA E A LEI DO HUMOR...


A ARTE DO RISO


“Sorrio quando o que eu mais desejo
é gritar todas as minhas dores para o mundo...”.

(1889 – 1977)
Cineasta britânico



Por dias, em função de uma rebeldia qualquer ou quiçá de um capricho do meu 3G, a minha conexão com o universo sem fronteiras, que é a internet, me deixou a ver navios, sem a possibilidade de navegar. Nada engraçado! Agora, se não foi uma artimanha de natureza tecnológica, só pode ter sido alguma travessura de um engraçadinho qualquer. Afinal, sexta-feira, 10, foi o Dia Universal do Palhaço, oportunidade, inclusive, em que também se comemora a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Organização das Nações Unidas - ONU no dia 10 de dezembro de 1948. Aos direitos humanos, contudo, um vínculo com o riso e, sobretudo, com a paz. Falando nisso, de nada adiantaram as pressões veladas e as não veladas exercidas pelo governo da China comunista para que o dissidente político chinês Liu Xiaobo, 54, detido por subversão, fosse indicado para o Prêmio Nobel da Paz de 2010 nem, muito menos, ser laureado. Tanto que, no dia oito de outubro, a decisão foi oficialmente anunciada por Thorbjoern Jagland, presidente do Comitê Nobel em Oslo, na Noruega.

Ocorre que, na terça-feira, 7, deste mês, três dias antes cerimônia de entrega do renomado prêmio a Liu Xiaobo por sua não-violenta luta pelos direitos humanos na China, a porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores, Jiang Yu, fez, direto de Pequim, uma deslavada declaração à imprensa, garantindo, entre outras coisas, que a maioria dos países convidados a comparecer ao evento iria boicotá-lo – informação, entretanto, desmentida por Geir Lundestad, diretor do Instituto Nobel. Porém, à ocasião da deselegante declaração, além de nada diplomática – nenhuma surpresa, já que os camaradas chineses sequer vislumbram o que seja diplomacia –, a porta-voz do governo chinês disse, em alto e bom som, que, por orquestrarem entre eles uma agitação antichinesa, os membros do Comitê Nobel não passam de meros “palhaços”. E tudo isso apenas porque, “nas últimas duas décadas – como já havia dito Thorbjoern Jagland – Xiaobo foi um grande porta-voz em favor da aplicação dos direitos fundamentais na China”.

Enfim! O dia dez chegou e, apesar da ausência do homenageado – que detido estava nos porões da China, detido permaneceu, enquanto a sua mulher cumpre prisão domiciliar – a cerimônia simbólica realizou-se com todo o glamour que sempre lhe foi devidamente merecido, sendo, contudo, nesse caso, afixada uma imensa fotografia do laureado no recinto. Outro detalhe é que, após o seu discurso de abertura do evento, no qual pediu ao governo chinês que libertasse Liu Xiaobo, antes mesmo do cumprimento da pena de onze anos que lhe foi imposta, já que o crime que lhe é atribuído resume-se ao simples fato de ele ter exercido o seu direito à liberdade de expressão, Thorbjoern Jagland depositou o diploma do prêmio do ativista pró-democracia sobre a cadeira vazia que lhe foi reservada – gesto que enfureceu à China, que não disfarçou a suposta força dos seus punhos de ferro e, duramente, o criticou, afirmando que o mesmo se tratava de uma “farsa política”, já que, pelas leis chinesas, o premiado é oficialmente considerado um criminoso. O pior é que...







Achando pouco, o governo chinês proibiu parentes de Liu Xiaobo de representarem o homenageado na entrega do prêmio. Isso sem falar na censura imposta aos canais estrangeiros de televisão, aos sites e as redes sociais da internet, evitando que a China tivesse acesso a informações referentes à solenidade, enquanto a estatal CCVT sequer mencionou o ocorrido. Muitos chineses, contudo, reagiram à censura. Os internautas, por exemplo, protestaram nas redes sociais chinesas. Bom! Boicotes à parte, Xiaobo tornou-se o primeiro cidadão chinês a receber o Nobel da Paz, pouco importando se o governo do seu país tenha tachado de “palhaços” – que feio! – os que concederam o prêmio ao contemplado deste ano. Enfim! Para o presidente do Comitê Nobel, Thorbjoern Jagland, é inadmissível o comportamento do governo chinês, sobretudo quando a China encontra-se em crescente poder político e econômico, não devendo, portanto, os seus dirigentes – os reais palhaços – ignorarem os direitos humanos.






O riso é ânimo que acalenta prantos



“Sorrisos onde há lágrimas...”.

Slogan da entidade humanitária Palhaços sem Fronteiras,
fundada em 1993 e com sede em Barcelona, na Espanha



De palhaço em palhaço – não os pejorativos bufões chineses –, a categoria adora pegar uma estrada, levando, na bagagem, por suas propriedades terapêuticas, apenas o riso... Organização não Governamental que atua em parceria com demais entidades humanitárias, como Médicos sem Fronteiras, Cruz Vermelha, entre outras, a Palhaços sem Fronteiras tem em suas fileiras não somente palhaços, mas demais artistas, de natureza circense ou não, e voluntários que, respeitando toda e qualquer diversidade cultural, realizam missões internacionais em regiões de situações de crise, conflitos bélicos, desastres naturais, desigualdades sociais etc em qualquer parte do mundo, com o objetivo de tentar minimizar danos provocados por não importa qual catástrofe, agindo, portanto, em zonas de vulnerabilidade.

Na mala, como já foi dito, eles portam consigo apenas risos, que, gentilmente, levam a centros educativos e sociais, mas, principalmente, a campos de refugiados e regiões de riscos, bem como as que possuem altos índices de pobreza ou graves problemas sociais, a fim de, através do despertar da alegria, tentar minorar os efeitos nocivos que as tragédias desencadeadas por certos insanos, tiranos sisudos e sem coração, legam as suas vítimas. Falando nisso, será que a China, cujo governo arbitrário mantém cativo o pacifista chinês Liu Xiaobo, além de repudiar o Prêmio Nobel da Paz com o qual o seu atual mais ilustre cidadão foi laureado, já teve o prazer de ser anfitriã dos Palhaços sem Fronteiras? Enfim! Quem quiser conhecer um pouco mais sobre essa entidade humanitária é só acessar o seu site oficial: www.clowns.org







As várias faces do riso


“Rir é o melhor remédio...”.

Dito popular

Provedor do riso, independentemente das suas origens, se culturais ou genéticas, quiçá com direito até à DNA – matéria para cientistas –, levando, ainda, em consideração os seus aspectos individuais e coletivos, já que é capaz de contagiar, o palhaço sempre é uma ajuda a mais para o desabrochar do humor – tão necessário nesse nosso mundo de faz-de-conta, igual ao Gato Risonho, personagem do livro Alice no País das Maravilhas, do escritor e matemático britânico Lewis Carroll (1832 - 1898). O palhaço, por sua vez, data, segundo pesquisadores – não todos – da Pré-História, ou melhor, da Idade da Pedra Lascada, quando, aliás, nem se pensava em poli-la e a espécie humana resumia-se a seres guturais habitando cavernas.
 
O riso, então, inerente ao palhaço, é, de natureza, lúdico, brotando de certa emoção. E, independentemente de ser ou não remunerado, quando, no caso, provem de um palhaço profissional, que também precisa sobreviver, embora muitas vezes sorria e estimule bem-estar em terceiros sem sequer ambicionar um retorno financeiro, a exemplo dos Palhaços sem Fronteiras e de muitos outros, o riso é incapaz de fazer mal. Nem mesmo aos corações dos mais empedernidos, que, por si só, se encarregam de alimentar a sua própria amargura, indiferente à satisfação que promove um sorriso. Porém, como toda regra tem exceções, quem não conhece as histórias de reis sisudos, os da antiguidade, que, muitas vezes, diante até dos gracejos mais bobos dos bobos das suas Cortes, desatavam a rir?
 
E, assim, alternando o regozijo que lhes proporcionavam as guerras insanas que desencadeavam, a fim de ampliar os seus domínios à custa da apropriação dos territórios alheios, bem como da exploração dos seus súditos, lhes cobrando cada vez mais impostos – parece que essas eram as únicas funções dos monarcas –, com as palhaçadas dos seus ditos bobos – uma espécie de catarse, provavelmente –, os reis até que se divertiam e se animavam. Porém, vale salientar que os bobos não tinham nada de abestalhados. Afinal, não foram raras as vezes, em meio as suas pilhérias, através das quais falavam certas verdades, mesmo que essas verdades fossem opostas as dos reis que serviam, que os bobos chegaram a influenciar em suas decisões políticas.
 
Exemplo disso é que, muito tempo depois, na Alemanha, os palhaços eram chamados de “alegres conselheiros”, já que, inteligentes, sagazes e astutos, acertavam nas observações que faziam e davam bons conselhos. No entanto, há quem diga que a origem do nome palhaço vem do italiano pagliaccio, oriundo de omino di paglia, que significa homem de palha – alusão ao homem do campo de origem humilde que, chegando a cidades desconhecidas e não conseguindo trabalho, ficava sem condições de se manter e passava a viver nas ruas, ganhando roupas e calçados de terceiros, mas de tamanho maiores e menores do que o seu, ficando o seu figurino, portanto, desproporcional, não diferenciando muito dos nômades, chamados de ciganos.
 
O fato é que é esse formato de palhaço, digamos assim, que conhecemos hoje, com roupas largas, sapatos exageradamente grandes, pinturas extravagantes e um jeitão desengonçado, mesmo que, na História da humanidade, muitas culturas, inclusive as indígenas, tenham tido o seu próprio formato de palhaço. Já na Idade Média, os palhaços perambulavam por feiras populares, buscando público e alguns trocados, que eles retribuíam com causos, embora fossem as suas trapalhadas que divertiam crianças e adultos. No teatro, contudo, com as suas peças, o poeta dramático inglês William Shakespeare (1564 - 1616) inverteu a ordem dos fatores ao mostrar que os palhaços também podiam fazer chorar, revelando, assim, uma outra face desses artistas.
 
Um dado curioso é que, apesar de muitas vezes ter sido visto como uma personagem ora burlesca, ora grotesca, ora estúpida, ora sarcástica, ora debochada, ora romântica – adjetivos não faltam –, afora as variantes pejorativas, a trajetória do palhaço ao longo dos tempos é plena de criatividade, em contínua evolução e mudanças. De qualquer modo, a verdade é que, embora solitário, a vida de um palhaço só tem sentido se ele interage com outrem: no circo, no teatro, nas ruas, nas feiras ou em qualquer outro lugar. Basta apenas que ele se sinta útil e cumpra com a sua função, que é a de fazer rir o seu público. Ou, como já disse Shakespeare, fazer chorar. O fato é que, carismáticos, os palhaços sempre foram e continuam sendo bastante populares.
 
Não é de hoje, por exemplo, que o mercado de trabalho dos palhaços ampliou incrivelmente as suas possibilidades de atuação – essa realidade, aliás, faz parte de todo e qualquer processo natural de evolução, com novas situações que despontam e novas oportunidades de espaços para a performance da categoria. Daí que muitos palhaços animam festas de aniversários, visitam doentes em postos e centros de saúde, bem como em hospitais, levando a alegria e esperança aqueles cujas vidas estão entregues à sorte, ou levando conforto aos que, por algum motivo, estão vivendo longe das suas casas, sejam asilos, abrigos, casas de repouso etc. Ah! Tem mais: hoje, com os avanços tecnológicos, uma nova dinâmica se exige dos profissionais em geral.
 
Inclusos, portanto, nessa dinâmica, os palhaços, que passaram a ter acesso à mídia eletrônica: emissoras de televisão e de rádio, onde muitos, inclusive, têm os seus próprios programas ou fazem comerciais; internet, que disponibiliza sites e redes socias; CDs, DVDs... Isso sem falar no cinema e em seus filmes. O objetivo do palhaço, contudo, continua o mesmo, ou seja, o de promover a alegria, despertando a nossa fantasia e alimentando o nosso imaginário. Ah! E a grande novidade, agora, pelo menos no Brasil, é a do palhaço político, do qual falarei na seqüência, esperando, apenas, que, tão logo assuma o seu mandato, o deputado federal eleito Tiririca proponha uma lei exigindo a obrigatoriedade do riso. Afinal, uma dose diária de humor não faz mal a ninguém...

 
Nathalie Bernardo da Câmara




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