Por Marina Silva
Ambientalista brasileira, ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente
(artigo publicado no dia 08 de fevereiro de 2013 no jornal Folha de S. Paulo).
Têm coisas que alimentam nossas esperanças e reafirmam as utopias. Na semana passada, estive na Costa Rica para uma conferência sobre projetos socioambientais. Em três dias, tive a oportunidade de conhecer várias lideranças sociais da América Latina e suas experiências inovadoras, de expressivo resultado cultural, social, econômico e ambiental.
Foi muito animador transitar nesse ambiente. É o tipo de experiência que amplia a visão e deixa mais perceptível como é limitador restringir-se ao espaço da política institucional.
Venho dizendo que as sementes de profundas mudanças estão espalhadas por todos os lugares do mundo. Para percebê-las, é preciso colocar as lentes do século 21.
Edgar Morin diz que, no começo, a mudança é apenas um pequeno desvio e que devemos estar atentos para apoiar aqueles que devem e precisam prosperar. Vi muitas iniciativas com potencial de atualizar políticas públicas e impulsionar a sociedade rumo à sustentabilidade: serviço de saúde de excelência para populações de baixa renda, arte e esporte para inclusão social e combate à violência, usos criativos e socialmente inclusivos dos resíduos sólidos, acessibilidade... a lista é longa e variada.
As novas iniciativas criam uma espécie de superfície de sustentação social e econômica, mas também conceitual, de valores e "modus operandi". Superam a mesmice e projetam o sonho de que um novo mundo é mesmo possível. Mostram que o mundo atual é fruto de nossas escolhas cotidianas, que podemos criar outras formas de organização e relacionamento entre nós e com a natureza.
Podemos ressignificar nossa experiência civilizatória. Podemos imaginar um Estado mobilizador, que incentive o potencial criativo da sociedade e nele se apoie para atualizar-se, desenvolver-se, recriar-se. Um mercado em que empresas com responsabilidade social e ambiental produzam bens e serviços para necessidades reais, muito além do supérfluo. Projetos culturais que humanizem as cidades e a convivência entre as gerações que nelas vivem. Programas que valorizem as comunidades tradicionais, detentoras de saberes raros e de alto valor civilizatório, estabelecendo vínculos e trocas saudáveis em vez da assimilação forçada ou do isolamento preconceituoso.
Esses e muitos outros sonhos são semeados em nossas cidades e vilas, campos e florestas. Estão nas escolas, nas comunidades, no trabalho de muita gente talentosa. São pequenos desvios que podem se transformar em grandes caminhos. É preciso mudar o olhar sem perder o foco e a clareza da visão. Em vez de enxergar no tecido social apenas números, votos ou impostos, podemos fazer como os cientistas do biomimetismo, que olham para a natureza em busca de boas ideias e soluções.
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