segunda-feira, 23 de agosto de 2010

ILHA DA FANTASIA


“A beleza provoca o ladrão mais do que o ouro...”.

William Shakespeare (1564 - 1616)
Poeta e dramaturgo inglês

O lugar não poderia ser mais aprazível. E, desde a minha infância, no quesito beleza natural, continua o mesmo. O inconveniente, contudo, esbarra no quesito humano, já que, não é de hoje, a praia de Ponta Negra, em Natal, no Rio Grande do Norte, tornou-se um reduto de estrangeiros. Nada contra estrangeiros... Ao contrário! Sou favorável ao intercâmbio de culturas, que só enriquece ainda mais a raça dita humana. Ocorre que, anos atrás, políticos gananciosos – não preciso mencionar nomes –, desprovidos de ética, sem preocupação alguma em manter protegido o seu próprio habitat contra não importa qual adversidade, praticamente expulsaram os barraqueiros da praia – as indenizações foram só um suposto consolo –, substituindo-os pelo capital estrangeiro e favorecendo o seu estabelecimento nestas terras do aquém-mar.



À época, muitas famílias da região perderam a sua fonte de renda, o seu sustento, pois viviam do trabalho nas barracas, visto que a pesca já não mais contava muito. Ninguém pensou nisso, insensível à causa dos nativos, menos favorecidos financeiramente, embora, por hábito, ou sina, eles sempre trabalharam de sol a sol. E nunca soube de alguém ter passado mal porque degustou das comidas típicas servidas nas barracas – gostosas até demais, diga-se de passagem. Sim, porque uma das coisas que pesou contra os barraqueiros teria sido a falta de higiene nas barracas. Ora, que argumento débil! Todos sabem que até em cozinha de hotel com padrão cinco estrelas ocorrem, digamos, inconvenientes higiênicos. Só que, parece tabu, não se comenta a respeito. Aos barraqueiros, portanto, sobrou, além das ínfimas indenizações, um cenário desolador.



Afinal, desde então, esse paraíso, que se chama Ponta Negra, foi infectado com todos os tipos de poluição: dos esgotos a céu aberto a tráficos de drogas, mulheres e congêneres... Sim, a exemplo de outras praias do Nordeste brasileiro, tipo Boa Viagem, em Recife, no Estado de Pernambuco, e de muitos belos recantos de Fortaleza, no Ceará. Os nativos? A quem trabalhava na tal praia, bem como os que a freqüentavam, tipo eu, para, simplesmente, desfrutar da sua beleza natural, sem interesse algum em adquirir dividendos, a exclusão. No entanto, alguns dos tais nativos ficaram no lugar. Os mais jovens, disponibilizando a sua força de trabalho para os estrangeiros, achando até bom demais – santa ignorância! – a presença alheia, desgovernada, que nem por inspeção da Receita Federal passa. Outros, também, sem noção de natividade, obtiveram privilégios.



Ou foram calados, subornados pelos que engendraram mudanças tão radicais em Ponta Negra, chegando, mesmo, a comprometerem os seus ideais e os dos seus pais, que nasceram e foram criados lá. Digo isso porque, outro dia, contrariando a opinião de muitos, que dizem que Ponta Negra tornou-se persona non grata, visto a poluição do mar está acima do permitido pelas normas ambientais vigentes e que quase mais ninguém de Natal freqüenta o lugar, que virou um balneário de estrangeiro, manifestei o desejo de ir lá. Afinal, se estou em Natal, embora não quisesse estar, quis nadar, como sempre fiz, e de andar, sentindo a água do mar molhando os meus pés. Assim, diferentemente de muitos, como não tenho medo de poluição – adoro adquirir anticorpos (me fazem mais humana) – e nem tenho receio de ser confundida com alguma prostituta, ou profissional do sexo - dito correto -, cujo ofício respeito, opção delas, como a de demais -, fui...



E, diga-se de passagem, passei um dia muito agradável, porque o fiz agradável. Afinal, quando quero, sou agradável. Conheci algumas pessoas legais e nadei muito. Caminhei. Fiz alongamentos e... Comprei novas havaianas. Infelizmente – não há como negar! –, Ponta Negra, de fato, não é mais a mesma. A única coisa que ainda se salva é o Morro do Careca, que, protegido por leis ambientais, interditado ao público, permanece praticamente o mesmo. Obviamente que mudou, por causa da erosão. Vento vai, vento vem... Mas, permanece lindo. No caso, para uma míope, como eu, que, ao entrar nas águas que marejam as suas areias, enxerga o morro até sem óculos. A tristeza, apenas, é confirmar o que muitos dizem – e têm razão –, ou seja, a praia de Ponta Negra tornou-se a própria Ilha da Fantasia... Mas, em tempos de globalização, nada podemos fazer para mudar essa deprimente realidade.


Nathalie Bernardo da Câmara

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