segunda-feira, 17 de outubro de 2011

RATOS E HOMENS


“Se tens um coração de ferro, bom proveito;
o meu fizeram-no de carne e sangra todo dia...”.

José Saramago (1922 - 2010)
Escritor português



Definitivamente, diferentemente da jovem alemã judia Anne Frank (1929 - 1945) – em seu pungente diário, redigido durante a Segunda Grande Guerra Mundial (1939 - 1945), quando a sua família sofreu perseguições sistemáticas dos nazistas, ela narrou detalhes das atrocidades cometidas pelo ditador alemão Hitler (1889 - 1945), um dos maiores psicopatas da História da dita humanidade –, eu não acredito na bondade humana...

Ao longo da minha vida, contudo, iludida pela ingenuidade e generosidade do meu coração poético, eu até acreditava que o ser dito humano era capaz de ações edificantes. Infelizmente – não faz muito tempo –, descobri a maldade, cruel. Não a maldade deliberada, aquela cometida conscientemente por mentes de natureza perversa, mas a maldade decorrente de gestos supostamente imbuídos de boas intenções, em nome do amor.

Ora! O nome já diz: amor deveria gerar vida. Infelizmente, há o amor obsessivo. Eu, particularmente, não quero esse tipo de amor para mim. É repulsivo, sobretudo quando ele provoca danos irreversíveis na vida do objeto amado, não importa a natureza da relação. Afinal, quem ama não deve fazer o mal, mas o bem. Caso contrário, fere. E ferida dói. O tempo passa, assim como as estações. Só a dor não passa. E o coração sangra, vergando de dor...

O fato é que ninguém enfarta só porque o colesterol está alto não. Pode enfartar por tristeza, desgosto, infelicidade, ressentimento, ódio... Pode morrer, sobretudo, por saudade! E saudade não se cura com intervenções cirúrgicas. Cirurgias curam feridas, legando cicatrizes que apenas ressaltam a dor. Como muito bem o disse a humanista norte-americana Rose Kennedy (1890 - 1995), nem o tempo cura a dor. As feridas permanecem lá, gritando.

Segundo ela, a dor pode até diminuir, mas nunca desaparece... Afinal, existem dores incomensuráveis, provocadas por excesso de amor. Infelizmente, tem gente que acha que, por amar, tem direito de posse do ser que diz amar, muitas vezes, inclusive, chegando a interferir em sua vida, embora ninguém seja propriedade de outrem. Só que o amor egoísta não pensa assim e vira algoz do ser que diz amar – vítima em potencial do sentimento narcisista que o oprime.

Na verdade, o amor egoísta só pensa em seu sentimento doentio e, dependendo da gravidade dos seus atos, pode gerar sequelas inimagináveis na vida da sua vítima, que precisa de muita sanidade, física e mental, para não sucumbir, já que a sensação que se tem é a de uma traição, mesmo não tendo sido essa a intenção, porque o amor egoísta é autoritário, agindo sob as suas próprias leis, já que desconhece as leis do coração e, muitas vezes, as jurídicas.

O pior é que, nos dias de hoje, contrariando uma das fábulas do elefante e da formiga, quem vence o embate não é o diálogo, mas o peso da arrogância, a do amor egoísta. Sem falar que vivemos em uma sociedade majoritariamente cristã – não conheço um cristão que não veja no sofrimento uma virtude, como se isso fosse, digamos, uma condição sine qua non para a conquista do perdão dito divino por eventuais pecados cometidos.

O mais grave disso tudo é que, segundo o cristianismo, temos de perdoar o nosso algoz. Quanta sandice! De qualquer modo, deixa para lá. Cada um sabe de si. Daí que, para concluir esta postagem, cito o teólogo e historiador alemão Karlheinz Deschner:

“Cada vez que ouço um cristão falar de moral, sinto revoltar-me o estômago...”.

Nathalie Bernardo da Câmara




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