“O que se pode inferir sobre uma comparação entre a atividade do carteiro e a do poeta, é que em maior ou menor grau ambos trabalham com a palavra, têm a atribuição de levar a mensagem aos seus interlocutores...”.
Juarez Firmino
Professor universitário e gestor escolar brasileiro, comentando sobre o filme O Carteiro e o poeta – Il Postino (1994), dirigido pelo britânico Michael Radford. No drama italiano, baseado no livro Ardiente paciencia (1985), do escritor chileno Antonio Skármeta, o poeta chileno Pablo Neruda (1904 - 1973), interpretado pelo ator francês Philippe Noiret (1930 - 2006), exila-se, por motivos políticos, numa ilha da Itália. No local, ele conhece um carteiro quase analfabeto, vivido pelo ator, poeta e diretor italiano, além de um dos adaptadores do roteiro, Massimo Troisi (1953 - 1994), contratado exclusivamente para se encarregar da correspondência do exilado. Curiosamente, com o passar do tempo, ambos desenvolvem uma bela e cúmplice amizade, com o carteiro solicitando ajuda do poeta, obviamente que com poesia, a fim de conquistar o grande amor da sua vida.
Numa manhã de sábado nublada, após uma noite de chuva inesperada – o frio ameno a minimizar os dissabores da mais agressiva das estações, que é o Verão –, a campainha toca, tirando-me dos meus devaneios, visto que, na vã tentativa de tecer um poema qualquer, me perdia entre um verso e outro, na rima de certa poesia. Qual não foi, então, a minha surpresa ao me deparar com um carteiro, que, além de entregar a correspondência, apesar de, naquela manhã específica, não ser a sua rota habitual, aproveitou o ensejo para, quebrando o protocolo, divulgar um livro, de sua autoria, intitulado Há algo errado no paraíso – A Linguagem da fantasia e o desenvolvimento da personalidade. Ou seja, um ensaio, que, dividido em oito capítulos, cujas ilustrações de abertura são igualmente assinadas pelo autor, versa sobre a influência que a linguagem do universo lúdico exerce “no processo de desenvolvimento humano” e “a sua relação com as produções culturais”.
O livro, portanto, publicado em 2012, é o segundo de Francisco Canindé dos Santos, natural de Caicó, no Rio Grande do Norte, que, formado em Comunicação Social pela Federal (UFRN) e carteiro concursado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), estreou nas letras em 2009. Foi aí, então, que, instigada com o inusitado da situação, puxei conversa com o jovem, que já se apresentou como escritor, presenteando-o com um exemplar de um livro de poemas, de minha autoria, propondo, inclusive, que trocássemos e-mails – à ocasião, tomei conhecimento de que o jornalista-carteiro-escritor já está com um terceiro livro no prelo, sendo os temas ciência e religião os seus principais focos de interesses. Não obstante, fiquei sabendo, ainda, que, desde a sua adolescência, Francisco Canindé dos Santos também escreve poema, embora não com a mesma ênfase que dá à prosa. Enfim! Segundo ele, no primeiro parágrafo da conclusão do livro em questão:
— O reino do faz de conta é um local em que o real é parcialmente suspenso, retirado do tempo e do espaço (...). Esta atmosfera, ao repelir o protocolo da realidade, penetra mais adiante nos mistérios do inconsciente, liberando instintos que são reprimidos pela sociedade, ou até mesmo pelos entraves psicológicos do ser, como a vergonha e a timidez que impedem a expressão de certos desejos que causam o medo de não ser aceito pelos demais.
Há 350 anos tinha início
o serviço postal no Brasil
“As cartas são a alma do negócio...”.
James Howell (1594 - 1666)
Historiador e escritor anglo-galês.
A epígrafe acima até já pode ter sido considerada uma máxima em uma época não tão remota assim, visto que, paulatinamente, de uns tempos para cá, a carta tem sido substituída pelo e-mail, o correio eletrônico disponibilizado pela rede mundial de computadores, ou seja, a internet. Porém, no caso Brasil, o primeiro texto contendo as características de tal formato remonta ao dia 1º de maio de 1500, quando, fazendo as honras de escrivão da armada do navegador português Pedro Álvares Cabral (mil quatrocentos e alguma coisa - 1520), supostamente o responsável pelo achado das novas terras e cujas datas de nascimento e morte nada mais são do que uma enorme vaga, o escritor Pero Vaz de Caminha (1450 - 1500), também de nacionalidade portuguesa, descreveu as suas impressões sobre a recente conquista lusa, enviando-as, prontamente, após lê-las a um grupo seleto de ouvintes, a d. Manuel I (1495 - 1521), então rei de Portugal. Desse modo, portanto, segundo reza a História dita oficial, o referido documento – conhecido como a Carta de Pero Vaz de Caminha – é considerado a certidão de nascimento do Brasil. De qualquer modo, foi apenas no dia 25 de janeiro de 1663, com a criação do Correio-Mor – nome dado, naqueles tempos, à função do nosso hoje carteiro –, quando, para todos os efeitos, o serviço postal teve início no país, embora mensageiros outros (tropeiros e bandeirantes, bem como demais viajantes, incluindo escravos) também exercessem esse papel.
Curiosamente, foi apenas no séc. XIX, em 1835, que a então Empresa de Correios passou a entregar correspondências em domicílios, com a introdução, ainda, em 1852, do telégrafo no Brasil. Não obstante, ou seja, de 1663 a 2013, trezentos e cinquenta anos de atividades transcorreram no país, com novas formas de entregas sendo criadas. E nem mesmo a internet, que, com os seus correios eletrônicos, diminuiu, consideravelmente, o fluxo de cartas, fez o atual Correios e Telégrafos do Brasil perder a sua serventia, já que os carteiros e as carteiras continuam exercendo o seu ofício com presteza e eficiência, sobretudo diante de uma nova realidade, que é a da entrega de um sem fim de encomendas de produtos adquiridos pelos usuários de lojas virtuais. Isso sem falar – é inevitável – da quantidade de material publicitário, periódicos e faturas que, diariamente, circulam por toda parte. Ah! E, de vez em quando, felizmente, uma eventual carta de um familiar, parente, amigo ou conhecido que, apesar dos insistentes e exaustivos apelos de toda ordem, ainda não aderiram ou sequer pensam em aderir ao correio eletrônico ou a não importa qual rede social – a não ser, claro, a uma rede de balanço, de preferência artesanal, na expectativa, no caso, de receber uma resposta a uma dada carta enviada, com direito, evidentemente, a selo postal, para ser lida, de preferência, no vai e vem envolvente de uma amena lembrança amical...
NBC
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