Foto: Nathalie (28/6/2018)
Desnecessário uma epígrafe
– coisa à qual sempre recorro em minhas postagens.
Caminhando
numa calçada da Avenida Nascimento de Castro, no bairro de Lagoa Nova, em Natal
(RN), chamou-me a atenção uma barraca armada num canteiro, exibindo produtos de
consumo que considero sui generis, e
pensei que “aquilo” já não era mais nem Copa do Mundo – este ano, na Rússia –,
nem São João (24/6), a mais popular das festas juninas brasileiras, nem Santo
Antônio (13/6), o casamenteiro, nem São Pedro (29/6), o santo das causas
difíceis, para quem, aliás, atualmente, os católicos devem orar, a fim de
livrar o Brasil do golpe de Estado promovido por celerados de plantão há cerca
de dois anos, em 2016.
Verdade seja dita: vendo a tal barraca, tive a sensação de
que estava em meio a um Carnaval. E fora de época...
Na
tarde do dia seguinte, durante um banho para refrescar-me do calor dos Trópicos e espairecer as minhas ideias, floresceu um súbito interesse em
conhecer os donos da barraca em questão e fui até lá – logo eu – puxar um papo com eles. Conversa vai, conversa
vem, o casal Maria do Socorro da Silva, 55, e Ivanilson Caetano da Silva, 42,
revelou-se aparentemente encantador: no dia-a-dia, enquanto Ivanilson ergue os
seus tijolos, pois exerce o ofício de pedreiro, Socorro cuida da casa e de uma
filha de trinta e poucos anos – segundo ela, “especial”; os seus outros dois
rebentos, adultos, em suas labutas diárias.
Então...
Na barraca dos Silva, armada sempre neste período do ano há mais de três
décadas e aberta das sete da manhã até umas nove da noite, perguntei como
andava o movimento. “Fraco”, respondeu Socorro, atribuindo a queda das vendas
ao fato de o povo andar sem emprego, sem dinheiro e, principalmente, porque o
governador do Rio Grande do Norte todo mês atrasa o pagamento do salário dos
servidores públicos.
Corroborando
o que falou a sua companheira – o par está junto há vinte e seis anos, mas os
filhos são do primeiro casamento de Socorro –, Ivanilson afirmou que as vendas
caíram depois que a economista mineira Dilma Rousseff foi injustamente deposta do seu cargo de presidenta do Brasil.
Então...
De acordo com os cálculos de Ivanilson, as perdas giram em torno de 50%. Em seu
entendimento, elas – as perdas – caíram junto com a queda de Dilma...
Entusiasmando-me,
assuntei ainda mais, igual dona
Santinha, de quem virei fã, mas, diga-se de passagem, uma personagem do meu livro sobre tráfico de
pessoas, em vias de ser publicado por uma editora que, há dois anos, resolvi
abrir.
Daí
que, no assuntado, Ivanilson contou
que, para montar a barraca, antes noutro canteiro, na Avenida Antônio Basílio, paralela a atual, eles pagam um aluguel à Prefeitura de Natal. E antecipadamente. Eu quis saber quanto pagavam: “Este ano, respondeu ele, R$ 400,00”. Isso pelo
mês de junho. Porém, nos anos de Copa do Mundo, eles mantêm a barraca aberta
até o último dia de jogos, que cai em julho.
Falando
em queda, no quesito ‘Copa do Mundo’, o produto que mais vende na barraca é “roupa
do Brasil”...
Ocorre
que, durante o tempo em que estive com o casal Silva, algumas pessoas apareceram
para adquirirem um artigo ou outro à venda na barraca. E aproveitei para saber
o motivo de eles não irem às compras, por exemplo, num shopping, recebendo de todos praticamente a mesma resposta: “Praticidade”,
disse um advogado; “acessibilidade”, falou uma assistente social; “Facilidade”,
opinou um contador – todos saindo do trabalho nas proximidades, com exceção de uma
moça, que justificou a sua presença com um “eu ia passando...”.
De
passagem em passagem, o papo com os
Silva chegou ao fim – já era noite. De Socorro, ouvi: “O povo trabalha,
trabalha, mas não vê dinheiro. Agora, piorou de vez!”. Lembrei-me do conceito de
mais-valia de “tio” Marx (1818 - 1883), um gênio alemão, mas não me pronunciei.
Num repente, Ivanilson rematou: “Lula solto, resolve tudo!” Aí, calei-me de vez.
Despedi-me
e fui embora, a caminhar e a refletir sobre o meu inusitado final de tarde.
Nathalie
Bernardo da Câmara
P.S.: Falando em Copa do Mundo, um sopro bem forte de certo mausoléu, o do meu camarada Lenin (1870 - 1924), em Moscou, bem que poderia enviar um monte de gente indigesta, politicamente falando, direto para Oymyakon, na Sibéria, considerado o lugar habitado mais frio do mundo...
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Aceita-se comentários...