DOIS
BELOS E PUNGENTES VERSOS, que, “atrevidamente”, dividi em quatro e
montei-os numa arte que, por seu feitio, o teor do menu “devora”, alumiando
o meu blog, são, com efeito, os que colhi de um poema de autoria da acreana Eliana Castela, que, em
priscas eras, apesar de não simpatizar com a dor, atuou no teatro amador, afeita
que sempre foi ao regalo de viver – iguaria que a faz sorrir e cantar, decantando o deleite de uma
existência impregnada de um bom humor que lhe é intrínseco, peculiar, nada a
satisfazendo mais do que, de mochila em mochila, ultrapassar fronteiras, aventurando-se
mundo afora com o seu companheiro e também um querido meu, o escritor e artista
multifacetado Mané do Café, pseudônimo de Jorge Carlos Amaral de Oliveira, que,
diga-se de passagem, Eliana “importou” da cidade de São Sebastião do Rio de
Janeiro, logo se tornando produtora dos affaires artísticos e culturais
do moço, agregando-os aos seus. Um exemplo dessa harmoniosa parceria é que, ano
após ano, uma nova edição de um dos rebentos paridos pelo casal há uma década vem
à tona, isto é, a Folhinha Poética, um calendário em verso e prosa e em
formato digital, que, por sua proposta editorial, contempla poetas de pendores os
mais diversos e de não importa qual recôndito, a cada edição homenageando um
(a) operário (a) do verbo – em 2018, a poesia desta que ora escreve estas
parcas linhas foi a homenageada do referido ano. Então... Poetisa, apesar de,
atualmente, preferir ser chamada de poeta – anos atrás, ela gostava do nome poetiza
(sim, com z) –, Eliana já deu à luz a três livros: Da escrita rupestre à
era digital – alguns poemas, lançado pela Editora Mimeógrafo, bem
como uma espécie de diário de bordo, onde, poeticamente, com a chancela da
Chiado Editora, a artista registra as suas impressões Pelos Rios ao Sabor da
Fruta, ambos em 2017, além de Carmeliana: a festa das flores, uma
deliciosa celebração da Primavera declamada num só poema, ilustrado por Mané do
Café e publicado pela Ibis Libris Editora, em 2019. Porém, eventualmente, ela publica
os seus poemas em blogs, sites de periódicos e noutras mídias digitais. Um detalhe
é que, além de tecelã da palavra, Eliana é geógrafa de formação, especialista
em História da Amazônia e mestre em Extensão Rural, focando as suas pesquisas
acadêmicas nos povos indígenas do Acre, o seu cantinho, que acolheu o
lirismo de uma infância amparada pelo bucolismo e pela magia da floresta e regada
a banhos de rios – “a melhor diversão do mundo, daquele mundo” (prosa poética Abandono,
16/03/2020). Sim, os rios, reciclando lágrimas na doçura das suas águas. Quiçá,
uma das inspirações de uma iniciação poética tecida com a seiva leitosa das
seringueiras e temperada com os matizes, os sons e os tons da “florestania”
(dialeto acreanês), exalando o aroma do manacá do quintal da mãe,
dona Giselda – cenário fecundo para o seu début na poesia, com poemas desabrochando
e reluzindo sob a luz de uma candeia no breu e nas brenhas: um prelúdio que,
rendendo-se à sabedoria da mãe-terra, se deixou seduzir por mantos de mistérios
que nem mesmo a ludicidade do balanço embalando os sonhos de uma criança seria
capaz de desvendá-los. De há muito, conquanto, a despeito das “lendas”, a minha
amiga tem criado versos e histórias de gente grande, desmistificando-se por
onde quer passe a sua poesia, abrindo-alas – aplausos!
*
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Abaixo, ilustrado por Mané do Café,
o poema Escassez na íntegra, publicado no blog Carmeliana
(28/03/2020) – link anexado –, administrado pela própria Eliana Castela e abrigo
digital da sua produção literária, cujos últimos versos impeliram-me a escrever
sobre a poetisa.
Leitura Fiadeira
ESCASSEZ
Os anciãos
estão partindo…
Fomos pegos de
surpresa.
O
envelhecimento populacional,
não mais
preocupa.
Agora o mundo
corre o risco de perder a vetustez,
tornar-se
jovem de repente.
Será um mundo
frágil, de experiência
e de pouca
sabedoria.
A notícia não
é boa:
Não saia de
casa, feche a porta.
O tempo é
imprevisto, pode ser um mês, dois…
Sem que os
netos abracem seus avós,
sem que os
filhos toquem as mãos de seus pais.
Num único dia,
muitos velhos se vão.
Não velem seus
mortos.
Velar é
preparar o tempo de aceitação da ausência,
da falta que
os que morrem fará.
Dessa vez não
haverá tempo de preparação.
Para superar é
preciso olhar o horizonte
ver o sol
nascer.
Mesmo que se tenha
que fechar os olhos,
acender a candeia
da alma,
trazer a luz
que salva as vidas.
Lembre-se que hoje, no céu cinza da epidemia,
Lembre-se que hoje, no céu cinza da epidemia,
não é dia de lua, nem cheia, nem
meia…
Eliana
Ferreira de Castela
Blog Carmeliana:
Nathalie Bernardo da Câmara
Primeiro a gente fica sem palavras... Depois pensa, como é bom ser lida e receber algo escrito, sobre nós, por alguém que tem sensibilidade e sabe escrever. Muito grata, Nathalie.
ResponderExcluirPor mais que alguém escreva bem, Eliana, no caso, eu, nunca que poderia escrever algo bonito e estimulante se a motivação não fosse igualmente bela.
ExcluirRepito, você escreve bem. Repito, obrigada!
ResponderExcluirPara de rasgação de seda, Eliana... rs
ResponderExcluirRisos!
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