“O povo que subjuga outro forja as suas próprias cadeias...”.
Karl Marx (1818 -1883), filósofo alemão
Não há nada mais pernicioso do que a dita – ou seria maldita? – sociedade de consumo, impondo mudanças de hábitos e valores que só induzem à alienação. Pensei nessa questão devido um fato ocorrido outro dia, uma noite de domingo. De passagem por Natal, no Rio Grande do Norte, senti vontade de comer quibe cru e consultei a lista de telefone da cidade, à procura de um restaurante árabe. Não encontrei nenhum, apenas um fast-food, que se diz de origem árabe e que só digo o nome porque fui tão bem tratada que nunca mais coloco os meus pés lá nem o recomendarei para ninguém.
Bom! O tal fast-food (comida rápida, em inglês) ao qual me refiro é o Habib’s, a maior rede de lanchonetes do gênero de nacionalidade brasileira, cuja primeira loja foi inaugurada na cidade de São Paulo, em 1988. Em Natal, o Habib’s fica na Avenida Senador Salgado Filho, 2815, que, para minha surpresa – soube –, anda tendo muita aceitação, coisa que só posso atribuir a uma moda imbecil, como todos os modismos. Tanto que, a princípio, senti certa repulsa em ter de entrar em um fast-food – não sou afeita ao seu descontrole de qualidade –, mas, como eu não tinha opção...
Assim, ao entrar no tal estabelecimento, contrariada por estar em um templo do mau gosto culinário, dirigi-me a um garçom qualquer, fazendo o meu pedido. O despreparado funcionário, contudo, pareceu nem conhecer quibe cru, já que, de supetão, me perguntou:
— Com gergelim?
Ora, quem conhece a culinária árabe sabe que quibe é feito basicamente de carne e trigo. Daí que, ao ouvir tal disparate, pensei que estava tendo um pesadelo. Afinal, comer bem é algo que eu prezo. E o maluco foi que o jovem teimava comigo, insistindo no gergelim como ingrediente do quibe. Perdi a paciência. Ele, então, conduziu-me ao que eu poderia deduzir de chef, que, por sua vez, tentou desfazer o mal entendido, explicando-me que o funcionário tinha se equivocado – até parece! Disse-me, portanto, que o quibe do Habib’s era feito com carne e trigo, que não levava gergelim.
Mesmo assim, eu pensei em desistir e ir embora. Afinal, nem de gergelim eu gosto. Porém, como estava com tanta vontade de comer quibe cru – que eu adoro –, fiz o meu pedido, pagando, por ele, R$ 9,50. Porém, esperei, ainda, uns quinze minutos até o garçom entregar-me uma caixa, contendo o meu objeto de desejo, e fui para casa. Quando cheguei, sentei-me à mesa e, ao me deparar com a embalagem transparente que trazia o quibe, já achei estranho. A carne estava com um vermelho que não era normal em um quibe e mal se via o trigo. De qualquer modo, arrisquei experimentá-lo.
Não devia tê-lo feito, pois o quibe tinha gosto de apresuntado. Agredi o meu paladar e quase tive uma crise de refluxo. Nem imagino o que colocaram naquela coisa. Imediatamente, fechei a embalagem e a caixa, retornando ao Habib’s. Lá chegando, reclamei a qualidade do quibe ao garçom que tinha me atendido e ele disse que lamentava muito, porque aquele era o quibe que a lanchonete costumava fazer. Pedi que chamasse o gerente, que, prontamente, veio ter comigo. Voltei a reclamar e ele aceitou a devolução, ressarcindo-me com uma nota de R$ 10,00. Terminei ganhando R$ 00,50... Grande coisa!
O fato é que, voltando para casa, tirei um disco de pizza pré-cozido da geladeira e montei uma maguerite. Dias depois, no supermercado, comprei os ingredientes de uma receita que tenho de quibe. Ficou só faltando a carne, que tem de ser fresca e, de preferência, comprada em um açougue. Comprei. Em casa, pude, finalmente, preparar o prato que eu tanto desejava. E degustá-lo, óbvio, com cebolas em concha e azeite de oliva extra-virgem. Um detalhe: deve-se comer quibe cru com as mãos, bem gutural. No máximo, usa-se uma faca, mas apenas para colocar o quibe na cebola em concha.
Falando nisso, aproveitei e enrolei uns quibes para fritá-los – outra delícia, que costumo saborear com algumas gotas de limão e azeite. Tudo de bom! E, como diz uma expressão francesa, eu tive un repas de roi, ou seja, uma refeição de rei. Enfim! O fast-food, sinônimo de um estilo de vida movido pelo estresse, sendo criticado desde o final do séc. XX, não é nenhuma novidade e teve início com os irmãos McDonald, em 1940, nos Estados Unidos – só podia ser –, um país capitalista por excelência, cuja maioria da população vive um engodo em todas as esferas da sociedade.
Sim, tal qual um fast-food, cujas refeições rápidas apenas enganam. Não alimentam nem saciam a fome. Sem falar que se, por um acaso, eu sentisse vontade de tomar uma coca-cola, em situação alguma eu entraria, por exemplo, no McDonald, onde, por mais incrível que pareça, nem o referido refrigerante, que surgiu nos Estados Unidos, presta. Uma vez, experimentei e deixei o copo com a bebida pela metade. A sua qualidade é inferior ao contido nas tradicionais garrafinhas de vidro que estamos acostumados a ver e a tomar, sendo, portanto, os produtos servidos em um fast-food = vácuo.
Ainda mais considerando o excesso de embalagens descartáveis dos produtos dos fast-foods, não importa a sua nacionalidade nem especialidade dita culinária, que causa graves danos à saúde humana e ao meio ambiente. Enfim! O fast-food, qualquer que seja ele, é tão nocivo que até chega a ser uma afronta ser um adepto desse tipo de serviço, já que, consumir produtos como os disponíveis nesses estabelecimentos, não combina com nada, muito menos com as campanhas nacionais e internacionais, que, de uns tempos para cá, apregoam a busca por uma melhor qualidade de vida.
Afinal, sabemos, conquistar e manter a tão decantada qualidade de vida passa, em primeiro lugar, pela alimentação, por uma dieta balanceada, já que, não podemos negar, somos o que comemos, sejam alimentos sólidos ou líquidos. Isso sem falar no ar que respiramos, repleto de gás carbônico e demais toxinas, inclusive as emitidas pelo cigarro. Eu mesma, por exemplo, que sou fumante desde 1987, estou fazendo de um tudo, como dizem os goianos, para deixar de fumar: o meu presente de aniversário de quarenta e dois anos, no próximo dia 13 de abril. Corpo e mente agradecem...
Nathalie Bernardo da Câmara
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