sábado, 29 de maio de 2010

NO MUNDO DA MALDADE...



“Não te irrites, por mais que te fizerem...
Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
teu mais amável e sutil recreio...”.

Mário Quintana (1906 - 1994)
Poeta e jornalista brasileiro


Outro dia, um amigo, lá de longe, angustiado que estava, enviou-me um e-mail, contando que foi vítima de uma psicopata. E ele me contou meio que sem saber como, porque, até então, ainda não havia digerido muito bem o que lhe havia acontecido e estava desesperado. Como ele sabia que eu já tinha sido vítima de uma criatura com erro de fábrica, como alguns especialistas chamam a psicopatia, ele pensou que, de certa forma, eu iria entender o seu problema. Aí, desabafou: virei divã.

Entender eu não entendo, meu amigo, porque a psicopatia extrapola qualquer forma de normalidade, mas posso ser solidária, já que, de fato, vivi, digamos, uma situação delicada, cujos respingos sinto até hoje, igual fantasma, rondando a minha vida, não desejando a ninguém o que me ocorreu. E eu só posso dizer, querido, indo ao fundo das minhas entranhas, que o pior não é nem a psicopatia em si – a medicina pode cuidar e sugerir paliativos, aliviando o mal –, mas quando o psicopata é alguém que você ama.

Esse é o drama e é insuperável, doendo mais do que aquela anestesia que você toma para que o médico possa costurar o corte que levou na sola do pé, que é dor física e passageira. No caso de cortes morais, a dor é emocional e permanente – se brincar, vai com você ao túmulo –, visto legar uma sensação de impotência, já que ninguém tem como solucionar um problema que não tem solução. Sim, porque, infelizmente, ao contrário do que dizem certos especialistas e não é porque a ciência ainda não evoluiu o suficiente...

A psicopatia não tem cura: a vítima – se posso falar assim – nasce com ela, vive com ela e morre com ela. Por isso eu sentir pena de quem nasce psicopata. E muito lamento. Afinal, um psicopata tem todos os predicados que qualquer um gostaria de ter, mas que ele utiliza para o mal, o que os tornam inválidos. Assim, como não sou especialista no assunto – nem quero! –, mas apenas uma vítima (do psicopata) de outra vítima (da psicopatia), a única coisa que posso fazer é recomendar uma terapia – você escolhe a linha do terapeuta.

Ah! E um livro que li a respeito: Mentes perigosasO Psicopata mora ao lado, da psiquiatra brasileira Ana Beatriz Barbosa Silva. A autora, inclusive, que, de certa forma, me esclareceu o problema que não tem solução, prestou assessoria à novelista brasileira Glória Perez, em um folhetim recente, que abordava o tema, vítima, por tabela, de dois psicopatas, que mataram, a sangue frio, a sua filha, a atriz Daniela Perez (1970 - 1992). Depois de ler esse livro, confesso que não fui mais atrás de outros que me explicassem o problema.

Afinal, o drama foi-me explicado. No mais, li alguns artigos, aqui e acolá... Se quiser e se eu puder ajudar você e demais pessoas vítimas da vítima, e se não quiser adquirir o livro, leia um resuminho básico do referido:


“A psicopatia, também conhecida como “sociopatia” (termo que alguns teóricos evitam), é normalmente associada a serial killers. No entanto, nem todos os assassinos são psicopatas e nem todos os psicopatas são assassinos violentos. Embora mais comuns entre os homens, atualmente também é possível encontrar mulheres no metiê. O portador começa a dar indicativos já na infância, quando maltrata animais de estimação corriqueiramente. Por volta dos 15 anos, na adolescência, os sintomas começam a se agravar e são bem perceptíveis, embora consigam “imitar” sentimentos dos outros:


•Ausência de culpa: nunca sentem arrependimento, nem remorsos. Agem como se os outros fossem os culpados por tudo o que acontece. Têm certeza de que nunca erram.


•Mestres da mentira: realidade e ficção, para eles, se fundem num só conceito, pelo qual regem seu mundo. São capazes de mentir como se tivessem realmente vivido uma determinada situação.


•Manipulação e egoísmo: não têm a noção do bem comum. Desde que ele esteja bem, o resto do mundo não lhe interessa. Usa as pessoas como “objetos”.


•Inteligência: o quociente de inteligência costuma ser acima da média, embora muitos profissionais discordem desse traço. A aparente inteligência poderia ser a extrema racionalidade em lidar com problemas.


•Ausência de afeto: não são pessoas afetuosas e não são do gênero que “dá colo” aos filhos.


•Impulsivos: devido ao déficit de superego, não consegue conter os próprios impulsos. Por isso, comete toda espécie de crimes.


•Isolamento: gosta de viver só, e quando vive em grupo quer ser líder, mesmo que destrua tudo o que possa encontrar pela frente.


Bom! Encontrei, também, um excelente artigo que fala a respeito do tema, intitulado O que é um psicopata?, publicado na revista Mente e cérebro, da Duetto editorial, de autoria de Scott O. Lilienfeld e Hal Arkowitz, professores de psicologia. O primeiro da Universidade Emory e o segundo da Universidade do Arizona. A tradução do artigo? Imagino que de um brasileiro: Julio Oliveira. A edição da revista é de número 181 e foi publicada em fevereiro de 2008. Eles questionam o que é um psicopata. Dá dó. Por eles, os psicopatas, e por nós...


Nathalie Bernardo da Câmara



@


O Que é um psicopata?


Dr. Lecter, psicopata vivido no cinema por Anthony Hopkins


Cercada de mitos, a psicopatia nem sempre está associada à violência e, ao contrário do que se imagina, pode ser tratada.

por Scott O. Lilienfeld e Hal Arkowitz


O termo “psicopata” caiu na boca do povo, embora, na maioria das vezes, seja usado de forma equivocada. Na verdade, poucos transtornos são tão incompreendidos quanto a personalidade psicopática.

Descrita pela primeira vez em 1941 pelo psiquiatra americano Hervey M. Cleckley, do Medical College da Geórgia, a psicopatia consiste num conjunto de comportamentos e traços de personalidade específicos. Encantadoras à primeira vista, essas pessoas geralmente causam boa impressão e são tidas como “normais” pelos que as conhecem superficialmente.

No entanto, costumam ser egocêntricas, desonestas e indignas de confiança. Com freqüência adotam comportamentos irresponsáveis sem razão aparente, exceto pelo fato de se divertirem com o sofrimento alheio. Os psicopatas não sentem culpa. Nos relacionamentos amorosos são insensíveis e detestam compromisso. Sempre têm desculpas para seus descuidos, em geral culpando outras pessoas. Raramente aprendem com seus erros ou conseguem frear impulsos.
Não é de surpreender, portanto, que haja um grande número de psicopatas nas prisões. Estudos indicam que cerca de 25% dos prisioneiros americanos se enquadram nos critérios diagnósticos para psicopatia. No entanto, as pesquisas sugerem também que uma quantidade considerável dessas pessoas está livre. Alguns pesquisadores acreditam que muitos sejam bem-sucedidos profissionalmente e ocupem posições de destaque na política, nos negócios ou nas artes.

Especialistas garantem que a maioria dos psicopatas é homem, mas os motivos para esta desproporção entre os sexos são desconhecidos. A freqüência na população é aparentemente a mesma no Ocidente e no Oriente, inclusive em culturas menos expostas às mídias modernas. Em um estudo de 1976 a antropóloga americana Jane M. Murphy, na época na Universidade Harvard, analisou um grupo indígena, conhecido como inuíte, que vive no norte do Canadá, próximo ao estreito de Bering. Falantes do yupik, eles usam o termo kunlangeta para descrever “um homem que mente de forma contumaz, trapaceia e rouba coisas e (...) se aproveita sexualmente de muitas mulheres; alguém que não se presta a reprimendas e é sempre trazido aos anciãos para ser punido”. Quando Murphy perguntou a um inuit o que o grupo normalmente faria com um kunlangeta, ele respondeu: “Alguém o empurraria para a morte quando ninguém estivesse olhando”.

O instrumento mais usado entre os especialistas para diagnosticar a psicopatia é o teste Psychopathy checklist-revised (PCL-R), desenvolvido pelo psicólogo canadense Robert D. Hare, da Universidade da Colúmbia Britânica. O método inclui uma entrevista padronizada com os pacientes e o levantamento do seu histórico pessoal, inclusive dos antecedentes criminais. O PCL-R revela três grandes grupos de características que geralmente aparecem sobrepostas, mas podem ser analisadas separadamente: deficiências de caráter (como sentimento de superioridade e megalomania), ausência de culpa ou empatia e comportamentos impulsivos ou criminosos (incluindo promiscuidade sexual e prática de furtos).

Três mitos

Apesar das pesquisas realizadas nas últimas décadas, três grandes equívocos sobre o conceito de psicopatia persistem entre os leigos. O primeiro é a crença de que todos os psicopatas são violentos.

Estudos coordenados por diversos pesquisadores, entre eles o psicólogo americano Randall T. Salekin, da Universidade do Alabama, indicam que, de fato, é comum que essas pessoas recorram à violência física e sexual. Além disso, alguns serial killers já acompanhados manifestavam muitos traços psicopáticos, como a capacidade de encantar o interlocutor desprevenido e a total ausência de culpa e empatia. No entanto, a maioria dos psicopatas não é violenta e grande parte das pessoas violentas não é psicopata.

Dias depois do incidente da Universidade Virginia Tech, em 16 de abril de 2007, em que o estudante Seung-Hui Cho cometeu vários assassinatos e depois se suicidou, muitos jornalistas descreveram o assassino como “psicopata”. O rapaz, porém, exibia poucos traços de psicopatia. Quem o conheceu descreveu o jovem como extremamente tímido e retraído.
Infelizmente, a quarta edição do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-IV-TR) reforça ainda mais a confusão entre psicopatia e violência. Nele o transtorno de personalidade anti-social (TPAS), caracterizado por longo histórico de comportamento criminoso e muitas vezes agressivo, é considerado sinônimo de psicopatia. Porém, comprovadamente há poucas coincidências entre as duas condições.

O segundo mito diz que todos os psicopatas sofrem de psicose. Ao contrário dos casos de pessoas com transtornos psicóticos, em que é freqüente a perda de contato com a realidade, os psicopatas são quase sempre muito racionais. Eles sabem muito bem que suas ações imprudentes ou ilegais são condenáveis pela sociedade, mas desconsideram tal fato com uma indiferença assustadora. Além disso, os psicóticos raramente são psicopatas.

O terceiro equívoco em relação ao conceito de psicopatia está na suposição de que é um problema sem tratamento. No seriado Família Soprano, dra. Melfi, a psiquiatra que acompanha o mafioso Tony Soprano, encerra o tratamento psicoterápico porque um colega a convence de que o paciente era um psicopata clássico e, portanto, intratável. Diversos comportamentos de Tony, entretanto, como a lealdade à família e o apego emocional a um grupo de patos que ocuparam a sua piscina, tornam a decisão da terapeuta injustificável.

Embora os psicopatas raramente se sintam motivados para buscar tratamento, uma pesquisa feita pela psicóloga Jennifer Skeem, da Universidade da Califórnia em Irvine, sugere que essas pessoas podem se beneficiar da psicoterapia como qualquer outra. Mesmo que seja muito difícil mudar comportamentos psicopatas, a terapia pode ajudar a pessoa a respeitar regras sociais e prevenir atos criminosos.







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