sábado, 6 de abril de 2013

PELOS ARES DO BRASIL*


“Eu naveguei pelo ar...”.

Santos Dumont (1873 - 1932)
Brasileiro, pioneiro da aviação

Outro dia, prestes a embarcar em um avião, eis que, na hora do check-in, um funcionário da companhia aérea pela qual eu iria viajar colocou-me em uma poltrona ao lado de uma janela que ficava em uma das duas fileiras diante de duas saídas de emergência da aeronave, gentilmente argumentando que, devido eu portar um notebook, eu teria mais espaço e mobilidade para digitar, pois não havia assento à frente. Agradeci pela deferência e me dirigi à livraria do aeroporto, onde, além de comprar uma revista de histórias em quadrinhos – que eu adoro – da Turma da Mônica, do brasileiro Maurício de Sousa, comprei, também, o livro de contos Um general na biblioteca, do escritor Italo Calvino (1923 - 1985), que, nascido em Cuba, viveu a maior parte da sua vida na Itália.


Sobre o livro de Calvino, que compreende trinta e duas narrativas escritas ao longo de quarenta anos, chamadas de contos, ou raccontini – continhos –, comentarei, neste blog, na seqüência, visto que, agora, gostaria mesmo era de versar sobre um episódio ocorrido no interior da aeronave, quando o avião estava prestes a decolar. Assim, após sair da livraria, me encaminhei ao salão de embarque, à espera do meu vôo. Minutos depois, portanto, já na aeronave, me vi confortavelmente instalada na tal poltrona que me havia sido reservada, logo tomando conhecimento de que uma equipe da Rede TV estava a bordo, tendo como destino Fortaleza, onde a emissora iria promover um debate com os candidatos ao governo do Ceará – evento que, inclusive, já estava sendo feito em algumas capitais brasileiras.


A minha frente, portanto, dois integrantes da equipe de televisão, que, aliás, eram para lá de divertidos, sobretudo porque eles ainda não haviam dormido desde o último debate, que ocorreu em Belo Horizonte. Então... Pouco antes das comissárias de bordo darem início as recomendações de segurança de praxe a todos os passageiros, indistintamente, uma delas, próxima a nós, que estávamos sentados nas poltronas ladeadas pelas saídas de emergência, nos reservou alguns minutos em especial. Atentos, o que ouvimos nos despertou um inexprimível espanto. Com uma aparente serenidade, a comissária nos perguntou se, por um acaso, diante de uma eventualidade, considerando que estávamos nos referidos assentos, estaríamos aptos para abrirmos as saídas de emergência.


Não deu outra! Pegos de surpresa com a inusitada pergunta – pelo menos para nós, que, até então, nunca havíamos sentado em tais poltronas, ou melhor, na tal zona de risco de uma aeronave –, todos os escolhidos, em número de dez, desatamos a rir, questionando o motivo da tal pergunta, embora, acredito, tenha é nos batido e abatido certa apreensão – de repente, nervosismo. Afinal, quem, não importa a situação de perigo, está realmente apto para abrir uma saída de emergência de um avião, sobretudo se este estiver no ar ou mesmo no mar? Bom! O fato é que a comissária permaneceu impassível, contrariando, contudo, e imagino que a contragosto, o seu próprio semblante, que, discretamente, franziu, como se, intimamente, ela estivesse a nos chamar de ignorantes.


De qualquer modo, ela prosseguiu, explicando que tal consulta aos passageiros sentados ao lado das saídas de emergência da aeronave era mera formalidade e que tentássemos entender tal procedimento, que era normal. Em uníssono, já que não tínhamos mesmo opção, só nos restou dizer que estávamos, sim, totalmente aptos para abrir as saídas de emergência do avião, caso realmente fosse necessário, embora – convenhamos – ninguém ali estava apto para cumprir tal responsabilidade – que disparate! O que poderia vir a ocorrer, se imperativa fosse tal necessidade, era a de sermos impelidos a. Daí eu achar que a palavra não seja bem aptidão para o cumprimento, digamos, de tal missão. Isto é, caso as circunstâncias de fato requeiram nem que seja um Plano B.


E, assim, no auge das risadas e piadinhas a respeito da impactante pergunta da comissária, aproveitei para lhe sugerir que o melhor, talvez, fosse dar aulas de sobrevivência a todos os passageiros, e não somente para os daquele vôo, mas para o de todos e no mundo inteiro – isso diante de uma fatalidade, caso se precisasse sobreviver em uma ilha qualquer. Afinal, no filme o Náufrago, drama do diretor norte-americano Robert Zemeckis, lançado em 2000, quando Chuck Noland, um inspetor de uma multinacional de cargas e correspondência, interpretado pelo ator norte-americano Tom Hanks, escapa de um acidente aéreo e se vê obrigado a permanecer em uma ilha do Oceano Pacífico por longos e sofríveis quatro anos, não lhe resta outra opção a não ser aprender a sobreviver.


É, esse, talvez, fosse, de fato, o ideal para todos os que se aventuram a viajar de avião – sim, porque viajar de avião não deixa de ser uma aventura, e de riscos – ou seja, fazer um curso básico de sobrevivência. Isto é – convenhamos –, quando, por sorte, em um acidente aéreo, haja sobreviventes. O que, infelizmente, não aconteceu quando, em maio de 2009, por exemplo, o vôo 447, da Air France, que, saindo do Rio de Janeiro com destino a Paris, explodiu nos ares. Se brincar, nenhum dos duzentos e vinte e oito passageiros nem tempo hábil teve para estar apto a abrir uma das saídas de emergência da aeronave, os quais, junto com os destroços do avião, logo após este sobrevoar o arquipélago de Fernando de Noronha, despencaram das alturas e submergiram nas águas do Oceano Atlântico...


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Passageiro: tragado pela ganância das companhias aéreas


“A ganância é insaciável...”.

Tales de Mileto (625 – 547 a. C.)
Filósofo grego


Mudando de assunto, embora não de espaço, a dieta imposta durante os vôos pelas companhias aéreas está cada vez mais restrita. De Natal para Fortaleza, por exemplo, nem água é servida. A não ser, é claro, que o passageiro a solicite. E – diga-se de passagem – sem direito a gelo. Já de Fortaleza para Brasília, o único alimento sólido servido – e isso no horário considerado de almoço – foi um pacotinho de amendoim de 15g – isso quando não é uma barra de cereal, que detesto –, que, aliás, tinha como companhia água, suco de caixinha ou refrigerante. Nada mais! Desse jeito, ninguém estranhe se, em breve – se é que já não tenha quem o faça –, vamos terminar por portar lancheiras, igual quando éramos crianças e íamos à escola, nas vezes em que formos viajar de avião.


Afinal, por mais que a invenção de Santos Dumont seja genial – eu, particularmente, adoro avião, enquanto carro me estressa, pois a maioria dos motoristas de há muito parece ter incorporado o espírito de pilotos de Fórmula 1 –, é inevitável não sentir um friozinho na barriga nas decolagens, durante os vôos, sobretudo quando há turbulências, e nas aterrissagens de uma aeronave. Desse modo, um serviço de bordo decente seria, no mínimo, uma distração para os passageiros em não importa qual ou quais trechos que eles fizessem. Tal oferta, aliás, nem sairia onerosa para as companhias aéreas, já que o valor das passagens – muitas vezes proibitivo para muitos – compensaria o investimento. Oneroso sai, sim, para o passageiro, que, além de pagar caro, passa fome nos vôos...

* Publicado originalmente no dia 26 de setembro de 2010. Fazendo uma faxina no meu blog, reli e desatei a rir...

Nathalie Bernardo da Câmara

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