Remonta ao escritor francês Charles Perrault (1628 - 1703), que, inspirando-se na tradição oral, publicou O Chapeuzinho Vermelho, em 1697, um dos Contos da mãe gansa, com o pseudônimo Perrault d’Armancour, nome do seu filho. Poderíamos até, para nos referirmos à versão dos Irmãos Grimm, transcrever, por exemplo, as palavras do Coelho Branco de Alice no País das Maravilhas, do romancista inglês Lewis Carroll (1832 - 1898), publicado em 1865, que disse: “Eu sou uma fraude!”. Sim, porque, a bem da verdade, os Irmãos Grimm negaram a versão original da historinha de Chapeuzinho Vermelho e deram corpo a outra versão e possibilidades de leitura.
Ainda segundo a pesquisadora, “vestir a sua heroína com um capuz vermelho – a cor das prostitutas, do escândalo e do sangue – simboliza o pecado da menina e a previsão do seu destino”. E ela conclui: “Somente agora, trezentos anos depois que Perrault transformou A História da vovó [tradição oral] em seu Le Petit chaperon rouge, é que o feminismo impregnou o conto de fadas de um sentido de patriarcado e nos deu o vocabulário e a estatística para ler O Chapeuzinho vermelho como uma parábola do estupro”. No caso, com o agravante da pedofilia, sendo, de certa maneira, a menina, o lobo e a vovozinha – os três – uma única personagem, em busca de uma identidade.
Diferentemente do desenho do francês Gustave Doré (1832 - 1883), a ilustração de Munro D. J., que acompanha o manuscrito de Perrault é ousada: “o lobo não usa disfarce e está em cima da menina, com uma pata de cada lado”, diz a pesquisadora brasileira Eliane T. A. Campello, em seu artigo As Múltiplas vidas de “Chapeuzinho Vermelho”. Segundo ela, que analisa a tese de Catherine Orenstein, “no fim do conto, a menina é comida por ele [lobo], sem salvação nem redenção. A perda da virgindade encontra sinônimo na expressão popular, na época do autor: elle avoit vû le loup – ela viu o lobo, incorporada na arte e na cultura dos últimos séculos com a mesma conotação sexual”.
De fato, uma versão sem escape, a de Perrault, considerado o pai da literatura infantil. Daí, a pergunta que não quer calar: Onde esteve o pai da menina durante toda a narrativa? Simbolicamente, o lenhador? Ou, segundo Bettelheim, o sujeito oculto no lobo? E que seria, sim, “a externalização dos perigos de sentimentos edípicos reprimidos e, como caçador [lenhador] na sua função resgatadora e protetora”. Uma informação à parte: existe um adendo na história contada por Perrault. Ou seja, um pequeno poema. Nele, ainda segundo o psicólogo, ficamos sabendo que “meninas bonitinhas não deviam dar ouvidos a todo tipo de gente”. As feiosas também, bem!
Afinal, a pedofilia não vê cara. Nem o estupro. E se as meninas dão ouvidos a todo tipo de gente – prossegue Bettelheim –, “não é de surpreender que o lobo as pegue e as devore”. Igual a história foi devorada pela mídia. Afinal, o mais popular conto de fadas foi reescrito não sei quantas vezes, adaptado para o teatro e o cinema outras tantas, virou moda de canção e, até, mote de cordel, inspirando, ainda, artes as mais diversas. Agora, vamos devorar a parábola, já que as proporções do estupro e da pedofilia, no Brasil, chegaram, realmente, a proporções alarmantes. E vem de toda parte, parte para cima de qualquer um, indiscriminadamente.
Vejamos alguns exemplos, recorrendo, para isso, a imagens. Elas falam por si só...
E voilà!
Versão surreal...
Cenas que não gostaríamos de ver...
E agora, José?
No Brasil, o número de páginas na internet denunciadas por divulgação de pedofilia e exploração sexual de crianças dobrou entre 2006 e 2007. A informação vem da Organização não governamental que cuida da Central Nacional de Denúncias por crimes Cibernéticos.Somente em 2007 foram realizadas 267.470 denúncias a respeito de 38.760 páginas com este tipo de conteúdo, contra 121.635 em 2006, envolvendo 17.148 páginas. O aumento entre um ano e outro foi de 126%.Este aumento pode ter sido gerado por dois fatores: o crescimento em 20% dos usuários da net no país e das redes de relacionamento. Em se tratando de rede de relacionamentos, o Orkut, com perfis e comunidades virtuais, é responsável por 90% das páginas denunciadas. Portanto, pais e mães, olho vivo nos amigos, comunidades e fotos que estão disponibilizados nos perfis de suas crianças (Este texto não é de minha autoria).
Deu no Expresso, de Portugal:
“Se depender do ministro da Justiça espanhol, Mariano Fernandez Bermejo, os juízes poderão vir a obrigar os pedófilos a submeterem-se a tratamentos de ‘inibição do desejo sexual’, ou seja, à castração química obrigatória para pessoas que tenham cumprido pena por abuso sexual de menores. O ministro da Justiça defende que tratamento siga critérios médicos e seja aplicado no caso de os visados continuarem a ser considerados perigosos para a sociedade. O tratamento com hormonas antiandrogénios leva à diminuição das hormonas masculinas ( testosterona e a di-hidrotestosterona), o que é comparável com o efeito da castração cirúrgica dos testículos. O resultado é facilmente medido através de análises ao sangue, permitindo ao clínico um melhor controlo da eficácia do tratamento”.
Nathalie Bernardo da Câmara
Pela estrada afora...
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