sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

UM BRASIL FORA DE ÉPOCA


“O povo toma pileques de ilusão com futebol e carnaval.
São estas as suas duas fontes de sonho...”.

Carlos Drummond de Andrade (1902 - 1987)
Poeta brasileiro



Drummond vacilou ao não mencionar a religião e a política como outros dois dos ópios que são fontes de ilusão do povo brasileiro. Afinal, no que concerne à religião e, sobretudo, à política, eu nunca vi um país andar tão na contramão dos tempos quanto o Brasil! Outro dia mesmo, por exemplo, inconseqüente que só ele, o presidente Lula cometeu não digo nem uma gafe, mas um disparate que, em minha opinião, merecia era um puxão de orelha dos ambientalistas mundiais. Ou seja, com o maior dos descasos – para não dizer arrogantemente –, o presidente afirmou que, pelo fato de nenhum grande líder político europeu não comparecer à Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP-16, em Cancún, no México, sendo os debates, por isso, poucos práticos, sem efeito global e nenhum avanço, ele não iria pôs os seus pés no evento, ressaltando, ainda, que o mesmo não daria em nada, que seria improfícuo. Tipo, em vão...

Porém, em resposta à declaração de Lula, a costarriquenha Christiana Figueres, secretária-executiva da Convenção Quadro da Organização das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas - UNFCCC, de imediato retrucou, alegando que, em momento algum, a COP-16 foi idealizada como sede de encontros de chefes de Estado, acrescentando, ainda, que, apesar disso, cerca de trinta líderes internacionais já demonstraram intenção de comparecer ao evento. Diante, então, dessa informação, fornecida direta ou indiretamente a Lula, Figueres esclareceu que, mesmo não sendo os chefes de Estado o público-alvo da COP-16, os que prestigiarem a conferência serão bem recebidos. Quando, contudo, da declaração descabida de Lula, ficou confirmado que a sua acompanhante à COP-16, que seria a presidente eleita Dilma Rousseff, também não iria prestigiar o evento. Sinceramente, melhor notícia não poderia haver!

Afinal, quem não se lembra da presença para lá de desastrosa de Dilma Rousseff na COP-15, realizada em Copenhague, na Dinamarca, em 2009? À oportunidade, então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma foi nomeada chefe da delegação brasileira ao evento, pecando, entretanto, por levar com ela, na viagem, uma comitiva exagerada de séquitos, além de, visivelmente deslocada do contexto, ter chegado ao cúmulo de dizer, em pleno evento, que “o meio ambiente é um entrave para o desenvolvimento sustentável”... No mesmo período, quando declarou que acreditava em Deus e em milagres, transferindo a responsabilidade pela solução, por exemplo, do aquecimento global a uma entidade supostamente divina, Lula praticamente assinou um atestado de autismo, a exemplo do que disse de Bento XVI o ex-primeiro-ministro francês Alain Juppé quando, em 2009, o religioso posicionou-se contrário ao uso de preservativos.


Isso, sim, nos dois casos, ou seja, no de Dilma e no de Lula, é o que se chama perder o sentido das realidades! Falando nisso, ou seja, em perda do sentido das realidades e em uso de preservativos, sobretudo em época de COP-16...




“Fantasia é um troço que o cara tira no carnaval...”.

João Bosco
Compositor e músico brasileiro



Semanas antes do Carnatal 2010, marcado para ter início nesta quinta-feira, 2, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Norte - Cremern cogitou entrar na Justiça, pedindo o cancelamento do famoso carnaval fora de época, realizado, anualmente, em Natal, caso a grave crise na rede pública de saúde não fosse solucionada pelo Governo do Estado. Afinal, segundo o presidente do Cremern, médico Luiz Eduardo Barbalho, o Rio Grande do Norte não estaria em condições de permitir a promoção de um evento do porte do Carnatal se o seu sistema médico-hospitalar estivesse em condições precárias, caso, por exemplo, do Hospital Walfredo Gurgel, a maior unidade de saúde do Estado e referência no atendimento de trauma, que sequer dispunha de algodão, gases e esparadrapos – um descaso total –, a comprometer o seu funcionamento, sobretudo porque a maior das micaretas do Brasil chega a movimentar em torno de um milhão de pessoas antes, durante e depois dos seus quatro dias de folia.

Porém, dias depois, com o compromisso do Governo do Rio Grande do Norte em investir R$ 20 milhões na renovação e no abastecimento de todos os hospitais do Estado até o final de dezembro e, de imediato, repassar R$ 2 milhões para a diretoria do Walfredo, a fim de garantir o atendimento dos casos mais emergenciais, o impasse, pelo menos momentamente, foi solucionado. Só que fico a pensar... E se o Carnatal, que está a completar vinte anos de existência, não estivesse com data marcada e não gerasse cerca de quarenta mil empregos diretos e indiretos, além de promover considerável aumento no consumo de bens e serviços locais nesse período, igualmente gerando divisas? Teria o referido repasse sido efetuado rápido do jeito que foi ou a saúde pública, no Rio Grande do Norte, ainda estaria entregue as moscas, além dos enormes prejuízos que acarretaria o cancelamento do evento? Bom! O fato é que as portas do Walfredo permaneceram abertas e a abertura do Carnatal aconteceu como o previsto.

Enfim! Com encerramento previsto para o próximo domingo, 5, o Carnatal acontece no Corredor da folia, no Largo do Machadão, o estádio de futebol da cidade, onde os foliões, em blocos, oficiais e alternativos, incluindo os infantis, com os seus respectivos abadás e embalados por ritmos que variam do axé music da Bahia ao novo forró, saem, por várias horas diárias e em um período de quatro dias, atrás dos diversos trios elétricos da eufórica micareta, contagiando a todos. Ao público, portanto, ávido por diversão, bem como aos próprios foliões, os dos blocos e os da chamada pipoca, localizada atrás do cordão de isolamento que protege aqueles que usam abadás, mas todos seguindo os trios elétricos, o Carnatal disponibiliza arquibancadas laterais ao Corredor da folia e, para quem quer um espaço, como dizem, mais reservado e confortável, seletos camarotes, repletos de atrações, como, por exemplo, DJs, internet, salões de beleza, comida e bebida, áreas de relaxamento e pistas de dança. É, de fato, uma megaestrutura.

Estrutura essa que, aliás, dispõe de um posto de saúde com um circuito interno de diversas ambulâncias, trabalhando em conjunto com o Sistema de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU, a fim de deslocar eventuais casos graves aos hospitais da cidade, bem como de uma praça de alimentação e de ambulantes, cadastrados pela Secretaria Municipal de Serviços Urbanos - Semsur, que colocam as suas barracas ao longo do percurso feito pelos trios elétricos e foliões, bem como ambulantes não cadastrados, chamados de invasores. Além disso, uma Fiscalização Preventiva Integrada - FPI, que reúne vários órgãos e instituições como, por exemplo, o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Rio Grande do Norte - CREA, Corpo de Bombeiros, Secretaria Especial de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal - Semurb, Promotorias de Defesa do idoso e da Criança e do Adolescente, fazem vistorias nas instalações do Corredor da folia, averiguando questões relacionadas à segurança dos foliões.

Agentes da Polícia Militar, Civil e Federal e a Polícia Rodoviária Federal - PRF, por sua vez, atuam fardados e à paisana dentro dos blocos, dos camarotes, nas arquibancadas e no entorno do Corredor da folia. Já a Companhia de Serviços Urbanos de Natal - Urbana, que garante a assepsia do Carnatal, costuma, anualmente, recolher uma média diária de cerca de vinte toneladas de lixo. Este ano, curiosamente, quando da abertura do evento, garis e catadores desfilaram no Corredor da folia, portando mensagens com temas ambientais, que exibiram ao público. Outra informação interessante é que os organizadores do Carnatal costumam promover ações sociais, como o estímulo aos catadores de cooperativas de reciclagem; a campanha Doe Sangue, em parceria com o Hemocentro do Rio Grande do Norte - Hemonorte; o combate ao trabalho infantil, à exploração sexual infanto-juvenil e ao uso de droga; estimulando, ainda, o uso de preservativos, que, nas edições do evento, são distribuídos aos foliões.

Este ano, por exemplo, com o slogan Prevenção, informações antes para não pegar a doença depois, o Programa Municipal DST/AIDS da Secretaria Municipal de Saúde - SMS, em parceria com organizações não-governamentais, realiza uma campanha educativa de prevenção contra doenças sexualmente transmissíveis, incluindo, no caso, a distribuição de duas mil camisinhas durante o evento, da mesma forma que o Programa Estadual DST/AIDS da Secretaria de Saúde do Rio Grande do Norte lançou a campanha Fique Sabendo, que consiste na realização do teste anti-HIV, embora de rápida testagem, através da coleta de sangue na poupa digital dos que comparecerem ao stand da campanha. Várias escolas, por sua vez, também se prontificaram a distribuir camisinhas aos seus alunos, a fim de que, ao caírem na folia, eles caiam com segurança. Enfim! Os organizadores do Carnatal consideram que, em duas décadas de realizações, o evento está consolidado, já tendo, inclusive, conquistado público e fama internacionais.

O atual estádio de futebol da cidade, contudo, cujo largo acolhe o Carnatal, será em breve demolido, já que no local e nos arredores será edificado o complexo arquitetônico de nome Arena das Dunas, onde deverão ocorrer alguns dos jogos da Copa do Mundo de 2014, já que Natal foi eleita umas das sedes do evento. Assim, os organizadores do Carnatal terão de encontrar um novo endereço para realizá-lo em 2011. Para mim, que não aprecio futebol nem as versões contemporâneas do carnaval, o fato é-me indiferente, sobretudo no caso do Carnatal, apesar de há anos ele promover diversão a ¾ – efeito que não acontece com quem não lhe é simpatizante, ainda mais quando se mora ou se trabalha nas imediações do Corredor da folia. E isso porque a euforia coletiva que emana da artificialidade do evento em nada lembra os antigos carnavais brasileiros, que, em sua origem, brotaram das nossas raízes culturais mais genuínas. A sugestão? Deixar a cidade e pegar a estrada, longe da poluição sonora dos trios elétricos...


Nathalie Bernardo da Câmara


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