“Se quem protesta não sabe exatamente no que bate, os seus alvos sabem perfeitamente porque apanham...”.
Nelson Rodrigues (1912 - 1980)
Uma pérola do polêmico e controvertido jornalista, escritor e dramaturgo brasileiro, que, proferida nos anos sessenta, anda, ultimamente, bastante em voga.
Não foram apenas as festas juninas, com as suas fogueiras, balões, rojões e quentões, que, em junho, esquentaram o Brasil, mas, sobretudo, os diversos protestos populares que, estalando feito milho de pipoca, eclodiram país afora, a ponto, inclusive, de provocar gagueira em muito jornalista de plantão – eu vi, na TV –, surpreendidos por tais eventos ao longo das últimas semanas. No dia 17, alguém reagiu: mais perdida – diga-se de passagem – do que cego em tiroteio, la presidenta Dilma Rousseff fez um pronunciamento, reconhecendo – pasme o leitor – que “a grandeza das manifestações [do dia 16] comprovam a energia da nossa democracia”. E qual o leitmotiv – digamos – desse tsunami dos Trópicos, que anda a abalar o status quo de muitas estruturas, privadas e públicas, e a tirar o sono de muita gente? Para Dilma, que, no calor dos protestos, pronunciou-se, hesitante, visto que, igualmente pega de surpresa, deu-se conta de que o seu pedestal é de barro, a “mensagem direta das ruas é pelo direito de influir nas decisões de todos os governos, do Legislativo e do Judiciário”. E o Executivo, eu perguntaria? Ela, contudo, se eximindo da responsabilidade que lhe cabe, prosseguiu com a sua fala: “Essa mensagem direta das ruas é de repúdio à corrupção e ao uso indevido do dinheiro público” – pense uma fala acertada! Ocorre que Dilma esqueceu-se de dizer que ela é quem gere as finanças do Brasil...
Porém, visto que o primeiro ato de protesto, ocorrido no dia 06, em São Paulo, foi convocado pelo Movimento Passe Livre (MPL), reunindo cerca de cinco mil pessoas, com esses números rapidamente aumentando a cada nova manifestação, que logo também passaram a acontecer em demais cidades brasileiras, embora já com um leque de novos reclames, há, entretanto, quem diga, por pouco não mordendo a língua ferina, que toda essa sequência de eventos teria sido apenas por causa de “uns míseros centavos” – o que é até compreensível, já que, afinal (não é de hoje), brasileiro costuma fazer vista grossa quando, por exemplo, recebe de troco, de um caixa de supermercado, uma caixa de fósforos ou um chiclete, quando não indiferença, no máximo demonstrando irritação, raramente indignação. E, ao final, tudo fica por isso mesmo, diferentemente, vejamos, do francês, que, culturalmente, não abre mão dos seus direitos, valorizando cada centavo. Ocorre que, ultimamente, numa tomada súbita de consciência, o Brasil anda correndo atrás do prejuízo... E em todos os sentidos! – os protestos deflagrados ultimamente que o digam, os quais, aliás, tiveram (sim!) como estopim o clamor da sociedade brasileira pela redução das tarifas dos transportes públicos em todas as regiões do país.
Tanto que, não demorou muito, o grito das ruas, ou melhor, o despertar do gigante, como se tem dito a 3x4, passou, na sua essência, a traduzir uma enorme insatisfação popular diante da atual conjuntura – insatisfação essa chamada por muitos de Movimento #Acorda Brasil ou outros correlatos –, sendo, portanto, os “centavos”, como se diz, apenas um dos itens de uma extensa pauta de reivindicações que, aliás, de há muito já deveria ter sido posta à mesa. E isso devido à inoperância do Congresso Nacional, que adora legislar em causa própria –, tendo como aliada a inércia de Dilma, cujo governo, assistencialista por excelência, tem exaurido a paciência do povo brasileiro, que, aliás, possui (sim!), uma gama de pertinentes reclamações a fazer. Em 2012, por exemplo, apesar do Brasil praticamente implorar de joelhos, Dilma não vetou o novo Código Florestal – um verdadeiro acinte à soberania das nossas florestas –, literalmente defendendo a sua devastação, ao invés de protegê-las, protegendo, por extensão, o meio ambiente como um todo – o que dirá da usina de Belo Monte, sangrando a céu aberto, tipo os nossos índios, que, diante da inexistência de uma política indígena, sofrem constantes atentados, eles e as suas terras, numa verdadeira saga!
Crime ambiental que ganhou projeção internacional, Belo Monte tem atendido apenas aos interesses nada escusos de grupos econômicos inescrupulosos, que trata com descaso a sociedade brasileira e o país. Então... No início de 2013, outro exemplo: quando das manifestações denunciando a prática do trabalho escravo no Brasil, Dilma sequer se posicionou a respeito dessa chaga social que continua vigorando em pleno séc. XXI! Sim, igual outra espécie de chaga – esta, contudo, corroendo as entranhas do país – ou seja, a de certos parlamentares, que insistem em afrontar a laicidade do Estado brasileiro (PEC 99), enquanto Dilma nada faz, nem fará, para coibir tal desplante – pelo contrário! Seguindo os passos dos seus antecessores, ela, com a sua postura, ou melhor, com o seu descabido silêncio, termina, tacitamente, endossando posições religiosas, quando, na verdade, de acordo com a Constituição brasileira, deveria limitar-se a respeitá-las. Desse modo, diante dessa nada exemplar covardia, “sobrou” para o povo brasileiro barrar o avanço religioso fundamentalista no país, não permitindo, nem que seja no grito, tamanho retrocesso. Isso sem falar na suposta reforma do Código Penal, que, datado de 1940, permanecerá, tudo indica, estagnado no tempo.
Afinal, o texto proposto pela Comissão Especial Interna do Senado Federal, ainda em fase de debates, já se caracteriza num ato de violência contra o próprio direito penal – outro retrocesso. E, isso, antes mesmo, inclusive, de ser submetido à votação, cuja data é incerta. Então... Não são poucos os problemas enfrentados pelo Brasil. E problemas estruturais! Daí, como querer que o povo brasileiro cale-se diante de tantas mazelas políticas, econômicas e sociais; diante de tantas desigualdades, assistindo, inerte, sem reação alguma, à lapidação sistemática do seu patrimônio nacional? Um evento, aliás, que tem deixado brasileiro indignado é a Copa de 2014, já que, enquanto o governo federal já “investiu” mais de R$ 26 bilhões com despesas referentes ao megaespectáculo, serviços públicos essenciais são relegados ao relento, literalmente falando – o mais curioso, entretanto, é que, ao tratar do referido tema no seu pronunciamento do dia 21 do corrente, novamente comentando sobre os protestos que andam a pulular pelos quatro cantos do país, Dilma, em cadeia nacional de rádio e televisão, “pisou na bola”. E por mais de uma vez. Numa delas, chegou a dizer:
— O futebol e o esporte são símbolos de paz e convivência pacífica entre os povos...
Ora, como se já não bastasse a má construção da frase e a sua redundância, a nobre representante do Executivo praticamente reservou ao futebol o status de instituição – em qual nível de hierarquia, mesmo? –, visto que o destacou de demais modalidades esportivas, sendo essa deferência, provavelmente, dada à FIFA! – uma federação que – diga-se de passagem – de há muito se tornou sinônimo de máfia. Ocorre que, independentemente dos interesses de certos mafiosos, o problema que ora se apresenta não é nem a Copa em si, mas o fato de, para sediá-la, o governo brasileiro descaradamente ter dado as costas para questões mais prementes, ou seja, privilegia um supérfluo – e um supérfluo dispendioso – em detrimento das reais necessidades do povo. Qual a parte, portanto, das atuais prioridades do Brasil que Dilma ainda não entendeu? Porém, ela tanto entendeu que, no dia 21, praticamente repetindo algumas falas do pronunciamento do dia 17, mais uma vez chegou a demonstrar certo apreço pela “mensagem direta das ruas”, que, aliás, “reivindica um combate sistemático à corrupção e ao desvio de recursos públicos”. O que falta, então, para que o seu mandato seja digno do povo brasileiro? Deve o povo insistir nos protestos, até que, na berlinda, ela e o Congresso Nacional façam jus aos votos que receberam?
A jornalista Dora Kramer, por sua vez, especialista em política, colunista do jornal O Estado de S. Paulo e comentarista da Band News FM, chegou a afirmar que o atual “clima nunca foi tão propício para uma reforma política” no Brasil. Pudera, visto que, apesar de as manifestações serem palpáveis, como a própria jornalista escreveu num dos seus artigos, transparentes e democráticas, “o mundo político insiste em dizer que desconhece as causas dos protestos” – coisa que, aliás, não me surpreende, considerando que, outro dia, assistindo a um telejornal, fiquei chocada com o fato de uma repórter se referir as manifestações como “passeios”, só faltando dizer passeios animados ou, quem sabe, divulgar que os manifestantes estavam a flanar, como se diz em francês, ou seja, simplesmente “curtindo”. De repente, até, “tirando uma onda”, como diz uma gíria brasileira. Ora, tenha dó! E daí, portanto, lendo o artigo de um amigo deputado estadual, vi que, apesar de bem escrito e elaborado, percebi que, nos dias de hoje, muitos ainda associam protestos políticos à filiação partidária – coisa que, necessariamente, não é uma regra e nem a ausência da mesma compromete a legitimidade dos eventos, não importa a sua motivação, já que é plenamente compreensível que o caráter de manifestações do porte das que estamos vivenciando nas últimas semanas corresponda à realidade do período histórico no qual elas estão inseridas.
Momentos distintos da História do Brasil
Foto: Evandro Teixeira
(...) Das luas de rua no Rio
em 68, que nos resta
mais positivo, mais queimante
do que as fotos acusadoras,
tão vivas hoje como então,
a lembrar como a exorcizar? (...)
Carlos Drummond de Andrade (1902 - 1987)
Versos do poema Diante das fotos de Evandro Teixeira, de autoria do poeta brasileiro, contido no livro Amar se aprende amando, publicado em 1985.
E manifestações como as de junho de 2013 – em julho, elas continuam – sempre implicam em profundas transformações, culturais, sociais e, sobretudo, políticas, de uma dada sociedade. No caso do Brasil, por exemplo, tivemos, no dia 26 de junho de 1968, há exatos 45 anos, a famosa Passeata dos Cem Mil, um acontecimento até então inédito na História do país – no dia 02 de maio, na Universidade de Nanterre, nos arredores de Paris, já havia eclodido aquele que viria a se tornar um dos mais emblemáticos acontecimentos históricos do séc. XX, logo tomando conta das ruas da capital francesa e ficando conhecido como Maio de 68, um divisor de águas na cultura ocidental. A Passeata dos Cem Mil, por sua vez, uma iniciativa da União metropolitana de Estudantes (UME), foi realizada no Rio de Janeiro em memória do secundarista paraense Edson Luís (1950 - 1968), assassinado brutalmente por policiais militares no dia 28 de março num restaurante da cidade. Reunindo estudantes, artistas, intelectuais, religiosos dos mais diversos credos e demais representantes da sociedade civil, o evento refletiu a insatisfação popular diante das arbitrariedades da ditadura militar (1964 - 1985), que, não demorou muito, editou, no dia 13 de dezembro, pelas mãos do marechal Costa e Silva (1902 - 1969), o famigerado Ato Institucional nº 5 – o AI-5, como ficou conhecido o instrumento jurídico que suspendeu as liberdades democráticas e os direitos constitucionais e individuais dos brasileiros, além de fechar o Congresso Nacional e censurar a liberdade de imprensa no país, dando início, portanto, aos chamados Anos de chumbo, felizmente soterrados em março de 1974, embora, por pouco mais de dez anos, ainda, as arbitrariedades promovidas pela ditadura militar iriam se fazer sentir.
Foto: Agência estado/Arquivo
No dia 25 de janeiro de 1984, na cidade de São Paulo, o jornalista Ricardo Kotscho produziu a reportagem Na Sé, um brado retumbante pelas Diretas, publicada no dia seguinte pela Folha de S. Paulo, que, segundo ele, foi “o único veículo da imprensa brasileira que, desde o primeiro momento, abriu amplo espaço para a cobertura do movimento” civil (1983 - 1984), que ocorreu sob a vigência da ditadura militar. De acordo, ainda, com o jornalista, a reportagem começava com os seguintes versos: “Ouviram do Ipiranga, às margens plácidas/De um povo heroico o brado retumbante”. E prosseguia: “Nunca, antes, em sua história de 430 anos completados ontem, São Paulo viu algo igual – centenas de milhares de pessoas transbordando da Praça da Sé para todos os lados, horas debaixo de chuva, num grito uníssono: ‘Eleições diretas para presidente! ’”. Desencadeado pelo teor da Proposta de Emenda Constitucional nº 5, que, se aprovada, restabelecia as eleições diretas para presidente da República em 1984, o movimento Diretas Já! foi, de fato, um marco na História do Brasil. Infelizmente, em decorrência de uma manobra política articulada pelo regime militar, o Congresso Nacional rejeitou a Emenda Dante de Oliveira, como a PEC nº 5 ficou conhecida. No intuito, contudo, de pelo menos tentar minimizar o quiproquó, foi instituído um colégio eleitoral, que, por sua vez, no dia 15 de janeiro de 1985, elegeu, indiretamente, o advogado Tancredo Neves (1910 - 1985), ex-governador de Minas Gerais, para presidir o Brasil. Porém, na véspera da sua posse, Tancredo é internado, falecendo dias depois – existe, inclusive, quem defenda a tese de que o político tenha sido assassinado –, assumindo, em seu lugar, o vice José Sarney – cargo que, aliás, parece exercer até hoje...
Foto: Autor desconhecido.
1989. Depois de vinte e nove anos da última eleição direta que houve no Brasil, a que conduziu o advogado mato-grossense-do-sul Jânio Quadros (1917 - 1992) à presidência da República, o povo brasileiro elegeu o empresário e economista alagoano Fernando Collor de Mello para chefiar o Executivo. Na verdade, o que ele chefiou, mesmo, foi uma quadrilha... Sim, porque, já nos seus primeiros 15 dias de mandato, Collor bloqueou o dinheiro de pessoas físicas e jurídicas depositado nos bancos. Isso sem falar que, além do famoso confisco, o seu mandato, pautado por corrupção, tráfico de influência, loteamento de cargos públicos e propinas, logo já foi revelando o “jeito Collor de governar”. Não deu outra! Em junho de 1992, o Congresso Nacional instalou uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar denúncias de crimes de corrupção no governo Collor. Porém, durante as investigações, Collor pediu ao povo brasileiro que, vestido de branco, saísse as ruas em sua defesa. O povo saiu. Só que, ao contrário do esperado, ele se vestiu de preto e pintou a cara com cores de todos os matizes, mas, principalmente e na sua maioria, com as cores da bandeira do Brasil. No rosto, bem como em cartazes, faixas ou qualquer base sólida, as inscrições Fora Collor (com um ‘l’ verde e o outro amarelo) e Impeachment já. Nascia, aí, então, o movimento dos Caras-pintadas, protagonizado pelos jovens e cada vez mais recebendo adeptos, com o Brasil sendo sacudido por algo até então nunca dantes visto por essas plagas. No dia 29 de dezembro de 1992, mediante renúncia, Collor saiu pelas portas dos fundos do Palácio do Planalto, ficando inelegível por oito anos – pense uma legislação benevolente com os políticos, como o é a brasileira! Isso porque, infelizmente – muitos eleitores alagoanos parecem que não têm memória ou não estudaram a História do Brasil –, o meliante retornou ao cenário político em 2007, eleito senador por Alagoas, numa afronta sem igual ao país!
E o povo retorna as ruas...
Foto: Autor desconhecido.
“O primeiro ato de protesto contra o aumento da tarifa de ônibus, metrô e trem na cidade de São Paulo aconteceu em 6 de junho. Convocado pelo Movimento Passe Livre (MPL), reuniu 5 mil pessoas. O segundo ato, no dia seguinte, juntou, também, 5 mil. O terceiro, 12 mil. O quarto, em 13 de junho, quando houve violenta repressão policial, 20 mil. Ao quinto ato compareceram mais de 200 mil. Ao sexto, mais de 50 mil. No sétimo, em 20 de junho, para comemorar a redução da tarifa, 100 mil. No mesmo dia, ocorreram manifestações em mais de 120 cidades brasileiras, com grande variedade de pautas. Dirigidas inicialmente a seus prefeitos e governadores, [as manifestações] passaram a ter como alvo principalmente o governo federal...”.
Emir Sader
Sociólogo brasileiro
Para o sociólogo Emir Sader, referindo-se a onda de protestos que assolou o Brasil em junho, “o crescimento muito forte do movimento seria impossível sem a ação monopolística dos meios de comunicação”, acrescentando:
— O governo está pagando caro por não ter democratizado os meios de comunicação. É um bumerangue que está voltando para as mãos do próprio governo.
Então... O protagonista do movimento civil que ora ilumina o Brasil continua o mesmo, ou seja, o povo brasileiro, enquanto o antagonista permanece sendo as forças políticas reacionárias do país. Porém, como foi dito antes, as motivações das manifestações de junho são, de certa forma, distintas, reconhecendo, ainda, que, a surpresa, mesmo, ou melhor, o diferencial na sequência de eventos que estamos vivenciando, foi o poder de mobilização das redes sociais, coisa que não existiu nos movimentos anteriores. E um poder de mobilização que, aliás, tem se mostrado assombroso, algo que, de fato, merece ser levado em consideração. Tem de sê-lo, já que as redes sociais são um instrumento de comunicação e, como tal, deve ser bem utilizado, sobretudo porque é um veículo democrático por excelência, de fácil acesso e de alcance mundial. Noutra escala, embora também com a importância que lhe compete, as mensagens divulgadas nas ruas pelos manifestantes, que andam a confeccioná-las não mais em grandes faixas, mas escritas, na sua maioria, em cartolinas, ou seja, a criatividade e a economia dos meios impulsionando para algo maior.
De qualquer modo, apesar de, desta vez, não serem os periódicos – jornais, revistas e congêneres – nem as emissoras de rádio e televisão a convocarem os protestos, a mídia também teve e continua tendo a sua importância. Segundo o jornalista Eugênio Bucci, professor da Escola Superior de propaganda e Marketing (ESPM) e da Escola de Comunicação e Artes (ECA-USP), foram “as investigações jornalísticas”, que “apareceram em reportagens da imprensa sobre as bandalheiras praticadas com o dinheiro público (...) que deram origem a cada bandeira, a quase todas as faixas e cartazes” presentes nas manifestações. Para o jornalista, em seu artigo E a notícia foi à passeata, publicado na edição de nº 788, de 1º de julho deste ano da revista Época:
— Foi o jornalismo crítico, o jornalismo que soube resistir ao assédio das autoridades que gostariam de domesticá-lo, que forneceu boa parte do repertório dessa imensa revolta popular: os gastos de aloprados deslumbrados com a Copa do Mundo, as mazelas da saúde, a caixa-preta do sistema de transporte urbano. O levante foi obra de gente bem informada, que agiu em rede e, principalmente, que agiu por sua própria conta, sem precisar de partidos, de sindicatos ou de ONGs. É bom não esquecer: as entidades tradicionais do movimento social (centrais sindicais, as grandes agremiações estudantis, sindicatos rurais) ficaram de fora, ocupadas que estavam em bater palmas para a propaganda do governo. As multidões foram às ruas sem ser tuteladas. Foram às ruas porque têm informação.
E, de fato, foi e ainda é realmente isso o que tem ocorrido. Nas palavras do jornalista, para quem “a imprensa livre é um componente essencial dos protestos”:
— Por mais que uma emissora bajule ministros ou promova o sensacionalismo policial, ela não é meramente um símbolo do poder. Ela também representa a liberdade de imprensa, sem a qual não haveria informação sobre coisa nenhuma. A grande maioria dos manifestantes sabe muito bem disso e exibe confiante seus cartazes para as câmeras. Sabe que o mesmo jornalismo que lhe contou sobre os abusos das autoridades constituídas agora conta ao mundo a história de um levante que mudará o país.
O que se tem visto no Brasil, portanto, não é que uma insatisfação do povo brasileiro, que, numa tomada de consciência política impressionante, está simplesmente exercendo o seu pleno e legítimo direito a cidadania. Uma pesquisa, contudo, realizada pelo Instituto Ideia, revelou que, antes das manifestações, 72% dos entrevistados consideravam o governo Dilma bom ou ótimo, enquanto, agora, esse percentual tenha baixado para 46%. Porém, é bom salientar que, apesar do resultado da pesquisa ser um indicativo da popularidade do referido governo, a mesma foi uma iniciativa de marqueteiros que trabalham para a oposição. De qualquer modo, quem não percebeu que, nas suas aparições públicas de junho, Dilma sequer se pronunciou em relação, por exemplo – entre outros temas polêmicos –, à PEC 37, que pretendia limitar o poder de investigação do Ministério Público, mas que, felizmente, devido à pressão popular, foi-se ralo abaixo na semana passada, bem como à PEC 33, que, se aprovada, pretende limitar os poderes do Tribunal Superior Federal (STF), aumentando os do Congresso Nacional, embora o povo brasileiro já tenha manifestado o seu repúdio à mesma – isso falar nos inúmeros escândalos de corrupção envolvendo o atual governo e o anterior, ainda sem solução, igualmente rechaçados pelos manifestantes nos seus protestos de junho. Enfim! Que o Congresso Nacional e la presidenta Dilma Rousseff parem de tripudiar com o país e ouçam com a devida atenção os reclames da sociedade brasileira...
NBC
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