terça-feira, 12 de abril de 2011

HOLOFOTES PARA SARNEY?


“Não há pior vilão do que o vilão consciente...”.

Miguel de Cervantes (1547 - 1616)
Escritor espanhol



N
o dia 23 de outubro de 2005, em meio a controvertidos debates, gerando polêmicas as mais diversas, o povo brasileiro engoliu goela abaixo o tal do Referendo acerca da comercialização de armas de fogo e munição em território nacional, popularmente conhecido como o Referendo do desarmamento, que, de cara, já influenciava, tendenciosamente, a opinião pública. O eleitor, por sua vez, foi obrigado a comparecer as urnas e se posicionar a respeito. À época, a pergunta que o eleitor leu nas urnas eletrônicas foi: O Comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil? Encarregando-se das campanhas pró e contra o tema do referendo, portanto, duas frentes parlamentares não economizaram munição em suas propagandas a favor das suas pregações: a campanha Pelo direito da legítima defesa, que orientava o eleitor a votar na opção de número 1, a do não, inclusive a vencedora, e a campanha Por um Brasil sem armas, apoiada, majoritariamente, pelos artistas, que sugeria a opção de número 2, a do sim. Eu, particularmente, não votei em nenhuma das duas opções... De qualquer modo, foi quando aprendi a anular – e conscientemente – o meu voto. Desde então, só digito 0000000000 na urna eletrônica e confirmo.

A única exceção, contudo, foi nas eleições de 2010, quando votei apenas na ambientalista Marina Silva para presidente do Brasil. Os candidatos para os demais cargos eletivos? Anulei, todos. Assim, quando do tal referendo, o fato de eu não ter votado nem na opção 1 nem da 2, pró ou contra o porte de arma, não significa que eu não tenha nenhuma opinião formada a respeito, que seja alienada ou qualquer coisa que o valha. Ledo engano, quem pensa assim. Eu só não vou ser a favor de um referendo desnecessário, estéril e oneroso aos cofres públicos – foram gastos, à ocasião, mais de R$ 400 milhões, que, aliás, escoaram pelo ralo mais do que a consciência da maioria dos políticos e, convenhamos, não deu em nada. Afinal, qual o crime de maior gravidade? O cometido por um civil psicopata, que porta uma arma de calibre 32 e 38, igual portava o jovem brasileiro Wellington Menezes de Oliveira, 23, que invadiu a Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, e, aleatoriamente, disparou cerca de sessenta tiros contra alunos do referido estabelecimento de ensino, matando doze adolescentes, além dos muitos feridos, ou o crime cometido pelo político que, por exemplo, assina um decreto corporativo e lega milhares à exclusão social?

Enfim! À época do tal referendo, escrevi em um artigo, citando um outro, igualmente de minha autoria, que dizia: “Só vou comparecer às urnas no dia 23 de outubro porque sou obrigada – ‘posso sofrer sanções legais se não for –, que antipatia!’. No entanto, mesmo sendo pacifista, adepta das idéias do indiano Mahatma Gandhi (1869 - 1948), e tenha uma opinião pessoal a respeito da comercialização de armas de fogo e munição no Brasil, eu não pretendo, por uma questão de protesto, emiti-la: vou omiti-la, anulando o meu voto”. Foi, como eu já disse, o que fiz. “Manifestando ou não a minha opinião, seja ela favorável ou desfavorável ao comércio de armas de fogo e munição no Brasil, os verdadeiros bandidos vão continuar soltos. (...) Assim, é incoerente punir apenas o bandido da favela, o traficante de drogas: ‘coerente seria tirar as armas e o poder dos bandidos que atuam no Congresso Nacional (cassando os seus mandatos), o traficante de influência, as lavanderias ambulantes’. Finalmente, ‘se é para desarmar o povo – algoz ou vítima –, que também desarmem os políticos e os empresários bandidos. Que desarmem os policiais que abusam de uma suposta autoridade para atirar em inocentes e que os expulsem da sua corporação’. Aí, sim, a justiça seria igualitária para todos”.

Ocorre que, “infelizmente, a nossa sociedade não é livre – muito menos justa e igualitária”. Bom! Transcrevendo, ainda, o referido texto de minha autoria, o problema é “o sistema capitalista (...), que cria situações desumanas, sem oferecer as condições mínimas de sobrevivência a qualquer que seja o povo que viva sob o seu jugo, sempre dizendo NÃO aos seus direitos básicos: moradia, educação, emprego, saúde, transporte e segurança, criando e gerando pobreza e miséria. Assim, sem uma vida digna, a começar da gestação da mãe, pobre em nutrientes; sem direito, muitas vezes, a uma infância saudável, normal e edificante, uma grande parcela da população, quando não morre de desnutrição, o que faz? Lamentavelmente, sem opção, recorre à violência para sobreviver. Agora, caso o referendo fosse para consultar o povo brasileiro se ele quer ou não mudar o atual sistema econômico, eu o defenderia com a maior satisfação do mundo, votando, inclusive, favorável! Aí, estaríamos, de fato, garantindo saúde, escola, alimentação e tudo o mais necessário para um ser humano ter uma vida decente – condição capaz de evitar a violência. Não somente, a violência urbana e a rural, mas, sobretudo, a cometida por políticos que só pensam nos privilégios que supostamente o poder lhes confere...”.

Falando nisso, lembro, meramente por acaso, de uma passagem da entrevista que fiz com a sempre tão maravilhosa escritora Lygia Fagundes Telles, publicada no extinto O Pasquim 21, no dia 23 de maio de 2003, em homenagem aos seus oitenta anos, na qual, aliás, ela se referiu ao escritor inglês Aldous Huxley (1894 - 1963), autor de Admirável mundo novo, publicado em 1932, quando, em remota visita ao Brasil, sentenciou, quase cego: “No dia em que o Brasil tiver mais escolas terá menos hospitais”. A autora de Ciranda de pedra, por sua vez -  o livro publicado em 1954 - , acrescentou que “no dia em que o Brasil tiver mais escolas terá menos presídio”. Simples, não? Porém, hoje, pouco mais de cinco anos depois do maldito referendo, o senador José Sarney (PMDB-AP), que, há meses, anda sem muito prestígio, achou que, se pegasse como gancho o drama da recente tragédia do Rio de Janeiro, atrairia os holofotes de novo para ele, me vem com essa história de plebiscito. E para outubro deste ano. É ter mesmo falta do que fazer, sobretudo aproveitando a deixa de la presidenta Dilma Rousseff está ausente do Brasil, visto que ela se encontra na China, fazendo negócios – se brincar, para lá de escusos. Além disso, quem, afinal, esse infeliz, o coronel do Maranhão, pensa que é?

A ministra-chefe da Secretaria de Diretos Humanos, Maria do Rosário, por sua vez, defendeu, nesta terça-feira, 12, a realização de um novo referendo para proibir a venda de armas a civis. Então, é plebiscito ou um outro referendo? Sei não, mas, talvez, o melhor fosse o retorno dos políticos à sala de aula, já que nem mesmo eles sabem a correta definição do que defendem. Para a jovem, “o Brasil precisa desse processo de desarmamento. Está claro que temos 16 milhões de armas no País e 50% delas são clandestinas, o que acaba motivando situações de crimes não só como esse, que aconteceu no Rio, mas contra mulheres e crianças, sem contar que a maioria dos acidentes com arma de fogo no Brasil envolve crianças”. Querem plebiscitos ou referendos para que derrames de dinheiro público sejam justificados? Falemos, então, de aborto, pena de morte, eutanásia, casamento entre pessoas do mesmo sexo, legalização de drogas etc, já que são questões polêmicas, embora, a meu ver, nem deveriam ser temáticas públicas nem controversas, pois são direitos fundamentais de um ser humano. Mas, quem não tem o que fazer, a exemplo dessa erva-daninha, que é o senador Jose Sarney, termina só provocando estragos cada vez maiores na sociedade. Esse homem não tem vergonha na cara? Tudo indica que não...



Túnel do tempo...

“A natureza criou o tapete sem fim que recobre a superfície da Terra. Dentro da pelagem desse tapete vivem todos os animais, respeitosamente. Nenhum o estraga, nenhum o rói, exceto o homem...”.

Monteiro Lobato (1882 - 1948)
Escritor brasileiro


H
á cinqüenta anos, no dia 12 de abril de 1961, o cosmonauta russo Yuri Gagarin (1934 - 1968), deu a primeira volta completa em órbita ao redor da Terra – volta essa, inclusive, que teve duração de 108 minutos. A bordo da cápsula Vostok 1, de apenas, 2,3 m, e a 327 km de altura acima da superfície terrestre, ele anunciou ao mundo, portanto, via rádio, que o nosso planeta era azul. Caso, contudo, o feito tivesse sido realizado nos dias de hoje, o cosmonauta provavelmente diria: — A Terra é cinza!



Nathalie Bernardo da Câmara


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