Por Marina Silva
Ambientalista e ex-senadora brasileira, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, dia 18 de outubro de 2013.
Li e quero compartilhar o artigo de Sérgio Abranches (em www.ecopolitica.com.br) que mostra com clareza a ideia de aliança programática, dando exemplos de como ocorre na Europa e do avanço que pode trazer à política brasileira.
Uso, assim, um instrumento comum na internet, onde se desenvolvem novos aplicativos para a democracia. Pelo compartilhamento recebo contribuições vindas de diferentes lugares e pessoas. Mas gosto da ideia para além do ambiente virtual, quando acontece na vida em sociedade: compartilhar é distribuir, colocar à disposição, recomendar. Assim se ampliam as possibilidades de uma nova política, na qual prospera um ativismo autoral, sem o controle das estruturas estagnadas de poder.
A democracia controlada pelos partidos, com a participação popular reduzida ao voto nas eleições, é só o passo inicial de uma longa evolução. Lutamos para conquistá-la, devemos defendê-la contra qualquer tentativa de retrocesso. Porém essa defesa não pode ser passiva, estacionária, tem que se dar num movimento de ampliar e aprofundar.
Podemos superar a ideia de hegemonia, que baseou a formação dos movimentos políticos modernos. Partidos buscam hegemonia na política, facções lutam pela hegemonia em cada partido, indivíduos o fazem dentro de cada facção. Paradoxalmente, a democracia torna-se o ambiente em que todos buscam reduzir a própria democracia.
A hegemonia se faz na ocupação de espaços, na divisão de cargos, na coalizão baseada em acúmulo de poder. O atraso político leva tudo isso ao pântano, ao ponto de degradar até a linguagem das negociações. Tome-se, por exemplo, a distribuição de ministérios e secretarias “com porteira fechada”, expressão que designa o controle de todos os cargos pela facção que recebe aquele pedaço do Estado.
Só um realinhamento político ancorado num programa pode desconstruir as máquinas de hegemonia e controle através do compartilhamento, da distribuição horizontal do poder e de ideias oriundas de vários centros não hierarquizados.
É possível ter estabilidade e “fazer as coisas” com uma política radicalmente democrática? Essa dúvida vem do medo de aceitar o outro, ouvir sua voz, compreender a necessidade de sua presença. Permanece entre nós a ideia militarista de divisão, embate, ordem unida. Eis a bipolaridade: governo contra oposição, aliados contra inimigos. No final das contas, brasileiros contra brasileiros. Repete-se o “ame-o ou deixe-o”, como se fosse impossível amar e discordar.
Numa agenda pactuada com a sociedade, compartilhando poder e responsabilidades, podemos criar um campo virtuoso em que a democracia é o ambiente no qual se gera mais democracia.
Chegaremos lá.
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