domingo, 1 de julho de 2012

DÁ UM TEMPO, EUA!

“Reivindicamos que seja outorgado asilo político ao senhor Assange porque o ‘crime’ que ele cometeu foi o de praticar o jornalismo...”.

Trecho de uma carta assinada por diversos intelectuais e artistas e entregue no dia 26 de junho à embaixada do Equador em Londres, onde o jornalista australiano Julian Assange, fundador do Wikileaks, encontra-se, desde o dia 19 de junho, sob a proteção do governo equatoriano, na qual, justificando o pedido, os signatários do documento dizem que o delito em questão nada mais foi do que revelar importantes crimes contra a humanidade cometidos pelo governo dos Estados Unidos, denunciando ainda que se trata de “um caso claro de ataque à liberdade de imprensa e contra o direito do público de conhecer verdades importantes sobre a política externa dos Estados Unidos”, que, por sua vez, acusam o jornalista de espionagem, nada impedindo que, caso venha a ser detido por autoridades norte-americanas, Assange seja condenado à pena de morte.


Que os Estados Unidos são revestidos de espelhos de vidro todo o mundo já o sabe – a Estátua da Liberdade não é que uma fachada –, agora, querer capturar vivo ou morto um jornalista só porque ele disse a verdade, provando, por A + B, as atrocidades, ou melhor, senão pior, os crimes contra a humanidade cometidos pelo governo norte-americano, é confirmar, sem hesitação, que a sua política em nada difere da aplicada no tempo do velho faroeste, obviamente que, nos dias de hoje, aperfeiçoada por uma tecnologia de ponta – não é à toa, portanto, que o linguista e ativista político norte-americano Noam Chomsky, um dos que, aliás, subscreve a carta entregue à embaixada do Equador, pedindo asilo político ao jornalista australiano, considera “esquizofrênicos” todos os líderes políticos que já governaram o seu país. E isso, segundo ele, não é de agora. Remonta à época dos primeiros colonos dos Estados Unidos [1]. Que o mundo, então, reaja, combatendo aqueles que, segundo o linguista, estão pondo em risco a vida do jornalista.

Refugiado há mais de dez dias na embaixada do Equador em Londres, Julian Assange já declarou que não irá se entregar à polícia britânica, que, por sua vez, pretende extraditá-lo para a Suécia, onde, segundo a revista Exame, “é suspeito de crimes sexuais”. O jornalista, contudo, defende-se da acusação não negando que manteve relações sexuais com as mulheres que o acusam, já que elas foram consensuais, mas denunciando que é vítima de “um complô internacional para silenciá-lo” devido acusações, que datam de 2010, após a divulgação, pelo jornalista, de documentos secretos dos Estados unidos, passando a viver, desde então, em regime de prisão domiciliar no interior da Inglaterra. Segundo Assange, a extradição para a Suécia não passa de um pretexto para que, logo em seguida, ele seja novamente extraditado. Porém, dessa vez, para os Estados Unidos, que o acusam de espionagem e que, a todo custo, querem a cabeça do jornalista, tendo sido essa a justificativa do seu pedido de asilo ao governo equatoriano.

Em comunicado divulgado à imprensa pela porta-voz Susan Benn, segundo a Agência France Presse (AFP) o jornalista afirmou que a sua decisão de permanecer refugiado na embaixada do Equador não deve ser considerada “um sinal de falta de respeito”. Afinal, ele prossegue: “Tanto na legislação internacional quanto na britânica, os pedidos de asilo predominam sobre os pedidos de extradição”. E essa decisão, de acordo com a porta-voz de Assange, foi orientada por seus advogados, que, temendo o pior para o seu cliente, estão em estado de alerta:

— Julian permanecerá na embaixada sob a proteção do governo equatoriano enquanto os elementos para sua solicitação [de asilo político] são reunidos e processados.

Numa reportagem, contudo, do jornal britânico The Guardian, ficamos sabendo que “autoridades do EUA disseram em audiência pública que o arquivo do FBI sobre a investigação já atingiu 42,135 páginas”. E Susan Benn denuncia:

— Há provas irrefutáveis no registro público de intimações a serem emitidas e testemunhas a serem obrigadas a depor contra Assange.

 
Foto: Getty Images


Segundo o jornalista norte-americano David Brooks, correspondente nos Estados Unidos do jornal mexicano La Jornada, embora a carta e os nomes dos seus signatários, intelectuais e artistas de nacionalidades diversas, corroborando o pedido de asilo do jornalista Julian Assange, tenha sido entregue na embaixada equatoriana, ela foi endereçada ao presidente do Equador, o economista Rafael Vicente Correa Delgado – uma iniciativa da organização norte-americana Just Foreign Policy, cujo diretor, o especialista norte-americano em política externa dos EUA Robert Naiman, encarregou-se da missão de entregar o documento, que, inclusive, à ocasião, foi acompanhado por uma petição assinada por mais de 4 mil simpatizantes à causa do australiano. Isso sem falar que se encontra disponível na internet, no site da Just Foreign Policy, um abaixo-assinado para os internautas que se dispuserem a apoiar o pedido de asilo do jornalista ao governo do Equador.

Link para a ação pública em inglês:

Link da tradução para o português:

Segundo ainda a AFP, a respeito do pedido de asilo político do jornalista australiano, o presidente do Equador Correa Delgado pronunciou-se: “Estamos analisando o caso com total responsabilidade e, como já dissemos mil vezes, não temos prazo para tomar uma decisão. (...) Faremos as consultas necessárias, mas essa decisão será absolutamente soberana e engajada à tradição humanista, ao devido processo de respeito aos direitos humanos que o Equador sempre manteve”. Enquanto isso...



O homem que não entende de liberdade, muito menos o que seja paz ou a fraude de nome Obama

Tradução: Senhor Wen, eu preciso da sua experiência...

“Se a administração Bush não gostava de alguém, raptava e enviava a câmaras de tortura. Se a administração Obama decide que não gosta de alguém, mata-o...”.

Noam Chomsky
Em entrevista ao Democracy Now, no dia 14 de maio de 2012.


Não é mais novidade que aquele que já foi o mais importante prêmio do mundo deixou de sê-lo, ou seja, o Nobel da Paz. Exemplo disso? Barack Obama ter sido agraciado com o prêmio em 2009. O pior, contudo, para justificar tal sandice, teriam sido as suas ditas boas intenções no intuito de reforçar o papel da diplomacia internacional e a cooperação entre os povos. Ora, tenha dó! Tanto que, na opinião de Chomsky, “o Comitê do Prêmio Nobel da Paz poderia muito bem ter feito escolhas verdadeiramente dignas, proeminentes, entre elas, a notável ativista política afegã Malalai Joya”, que, inclusive, vem sendo considerada a mulher mais corajosa do Afeganistão, denunciando publicamente os crimes de guerra cometidos pelas autoridades do seu país e uma crítica aberta contra o Talibã, movimento fundamentalista islâmico nacionalista, bem como do atual governo do presidente Hamid Karzai e dos seus defensores ocidentais, tornando-se alvo de busca dos seus desafetos 24 horas por dia e, portanto, correndo risco de vida.

Aproveitando, no caso, o ensejo, gostaria de citar outro exemplo da perda de status do Prêmio Nobel da Paz, que foi o da escolha para lá de equivocada do comitê em outorgá-lo a atual presidente da Libéria, a economista Ellen Johnson Sirleaf, em 2011, que o dividiu com “a também liberiana Leymah Gbowee, à época com 38 anos de idade, considerada ‘uma guerreira da paz’ por seu movimento pacífico de mulheres, já que, com a ajuda de uma greve do sexo, ela contribuiu para, em 2003, pôr fim à segunda guerra civil no seu país, e a jornalista iemenita Tawakkul Karman, uma liderança da Primavera árabe que, desde o início de 2011, passou a lutar pacificamente pela queda do presidente iemenita Ali Abdallah Saleh, enraizado no poder havia 33 anos” – registrei neste blog no dia 1º de maio deste ano. Ocorre que, apesar de ter sido contemplada com o prêmio “por suas ações em defesa dos direitos e da segurança das mulheres”, sendo, ainda, a primeira representante do sexo feminino a ocupar o mais alto cargo político de um país do continente africano, mal transcorreram dois meses do recebimento do prêmio, a Dama de ferro, como Sirleaf é chamada pelo povo liberiano, “declarou ao jornal inglês The Guardian que é a favor da criminalização do homossexualismo, cuja prática, aliás, em sua opinião, deve ser punida com duras sentenças pela legislação liberiana”. É mole?

De qualquer modo, para quem se interessar, o título da postagem à qual me referi é 1º de maio: Dia Mundial do TrabalhoA labuta diária de um Nobel da Paz, sendo o link para acessá-la o http://abagagemdonavegante.blogspot.com.br/2012/05/1-de-maio-dia-mundial-do-trabalho.html




Enfim! Segundo o jornal português Expresso divulgou no dia 26 de junho, “a vida de Julian Assange vai ser o tema do próximo filme do cineasta alemão Cyril Tuschi. (...) Em LeaksThree dates with Harry Harrison, longa de ficção, vamos acompanhar uma personagem (Julian Assange) que utilizava a Internet para encontros, usando o nickname Harry Harrison”. Para o produtor do filme, Jan Krüger, “o filme vai mostrar a ascensão e queda de alguém que sempre teve problemas com o autoritarismo, uma espécie de Robin Hood da era digital”. De acordo ainda com a reportagem, “em LeaksThree dates with Harry Harrison, o espectador vai acompanhar três encontros que foram fundamentais para a vida de Assange. O primeiro em 2010, na Islândia, a partir do qual o australiano criou uma organização que mudou o jornalismo, a democracia e a própria Internet. O segundo, na Suécia, com uma fã, quando já se via Julian Assange como uma estrela pop. O terceiro encontro, com uma jornalista, decorre em Londres, onde Assange faz um balanço da sua vida” – falando em vida...

Na dita real, Julian Assange é de uma ousadia de fato surpreendente. Afinal, enquanto aguarda a resposta ao seu pedido de asilo político, nem mesmo se encontrando refugiado na embaixada do Equador, não podendo sequer ultrapassar o perímetro, no caso, o espaço físico que garante a sua segurança, o jornalista não consegue parar quieto. Na última quinta-feira, 28 de junho, ele se aventurou no espaço que mais lhe é familiar, no qual realmente se sente em casa, ou seja, o virtual, e publicou um novo episódio, o de número 10, do seu programa The Julian Assange Show para Russia Today: uma teleconferência com Noam Chomsky e o escritor e ativista paquistanês Tariq Ali.

No link abaixo, a teleconferência é divulgada em inglês, com alternativas para o espanhol, o árabe, e o russo:

Porém, noutro link, teleconferência, embora em inglês, é acompanhada de uma transcrição para o português:

Enquanto isso, aguardemos o desfecho da história de Julian Assange e do seu tão esperado asilo político na Linha do Equador, limite entre os dois Trópicos, dois mundos, que, de repente, pode até assustar muita gente, mas, para o australiano, isso deve ser apenas um mero detalhe, já que vive num universo literalmente sem fronteiras...


1. No dia 4 de dezembro de 2009, Noam Chomsky, professor emérito de linguística do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, participou em Columbia de um debate sobre a hipocrisia e a “esquizofrenia” na política externa americana desde os primeiros colonos dos Estados Unidos até o mandato presidencial de George W. Bush. Foi quando falou sobre o imperialismo dos EUA. – The Spectator Columbia – Por Claire Luchette.

Nathalie Bernardo da Câmara

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