“No meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho...”.
Carlos Drummond de Andrade (1902 - 2002)
Poeta brasileiro
Se fosse escrever a sua Crítica da Filosofia do Direito de Hegel (1844) no mundo atual, estudo no qual diz que “a religião é o ópio do povo”, o filósofo e economista alemão Karl Marx (1818 - 1883) possivelmente não iria comparar os malefícios da primeira à droga que era referência de entorpecentes na Europa do séc. XIX, chegando inclusive ao ponto de desencadear guerras em seu nome, mas, sim, ao crack, que, a exemplo do aquecimento da Terra, de há muito já se tornou um problema global. E não somente por sua composição química – uma mistura da pasta-base de coca ou cocaína refinada com bicarbonato de sódio e água –, cujo efeito no cérebro é praticamente imediato, mas também, sobretudo, por ser uma droga de baixo custo, o que favorece a sua rápida proliferação. No Brasil, por exemplo, mais especificamente no Rio de Janeiro, o avanço do crack tem sido uma das maiores preocupações das autoridades municipais da cidade. Segundo o resultado, divulgado em meados de abril, de um mapeamento informal realizado pela Secretaria municipal de Assistência Social, a pedido do jornal O Globo, pelo menos onze cracolândias e outros seis pontos itinerantes de consumo da droga foram detectados na cidade, sendo estimados, ainda, cerca de 3 mil usuários (20% deles menores) circulando nessas áreas, “o que leva o município a gastar, mensalmente, R$ 2 milhões no acolhimento e tratamento de viciados”. Na verdade, de acordo com a reportagem sobre a referida pesquisa, publicada no dia 10 do mesmo mês, a prefeitura do Rio de Janeiro “até hoje não fez um mapeamento completo da geografia do crack na cidade”, anunciando para três dias depois a assinatura de um convênio pelo prefeito da Cidade maravilhosa “em mais uma tentativa de frear o avanço da droga”. Tanto que, no dia 13, a prefeitura e o governo estadual do Rio de Janeiro aderiram ao programa do governo federal Crack, é possível vencer, integrante, por sua vez, do Plano Nacional de Enfrentamento ao Uso do Crack e outras Drogas, lançado no dia 7 de dezembro de 2011 por la presidenta Dilma Rousseff – plano esse, aliás, considerado uma das suas principais promessas de campanha e para o qual foi previsto um investimento de 4 bilhões de reais. No dia 19 de junho, o jornalista brasileiro Jorge Antônio Barros, editor do portal Anselmo.com, divulgou a seguinte reportagem:
Tráfico proíbe a venda de crack em favelas do Rio
Foto: Antônio Carlos Costa
Boca de fumo na favela Mandela põe aviso de que vai proibir a venda de crack: é como uma farmácia anunciando que não vai vender mais remédios de tarja preta.
O tráfico de drogas vai proibir a venda de crack nas favelas do Jacarezinho, Mandela e de Manguinhos. A informação foi publicada na coluna de Ancelmo Gois de hoje com a foto acima. A medida, decidida pela maior facção do tráfico no Rio, ocorre dois meses depois de lançado no Rio o programa Crack, é possível vencer, do governo federal.
A ordem de proibir a venda de crack partiu de chefes do tráfico, que estão presos. A informação vinha circulando pelas comunidades, mas ontem pela primeira vez apareceu o cartaz anunciando a proibição, “em breve”, ao lado da cracolândia da favela Mandela, na Rua Leopoldo Bulhões, na chamada Faixa de Gaza. Os traficantes ainda têm ali cerca de dez quilos de crack. Cada pedra custa R$ 10,00. Há informações de que os criminosos temem que a Força Nacional de Segurança ocupe aquelas favelas, como ocorreu na comunidade Santo Amaro, no Catete, onde está há um mês e já apreendeu 1.513 pedras.
— Gostaria que essa decisão se espalhasse por todas as favelas do Rio porque o crack é uma droga devastadora e tem produzido só dor e sofrimento. – diz o presidente da Organização Não-Governamental Rio de Paz, Antônio Carlos Costa, que, desde 2009, faz trabalhos sociais na Mandela.
Durante muito tempo o crack era vendido apenas em São Paulo. Dizia a lenda que os traficantes do Rio não queriam produzir “zumbis”. Dependentes de crack vivem nas imediações das bocas de fumo, atraindo a atenção da mídia e de operações do poder público. O tráfico no Rio alegava que a clientela de crack – miserável – traria problemas à venda de maconha e cocaína, mas capitulou depois de supostas alianças com a facção paulista, e começaram a oferecer o entorpecente vendido junto com a cocaína.
O combate ao crack virou uma questão de honra para o governo Dilma, que anunciou investimentos da ordem de R$ 4 bilhões no programa lançado em dezembro do ano passado. A grande dificuldade, segundo o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, é a falta de pessoal capacitado para lidar com os dependentes de crack em todo o país. No Rio o programa foi implantado em abril, com a participação do governo do estado e da prefeitura. Só no Estado do Rio, a previsão de verbas da União é de R$ 240 milhões.
De alguma forma a prioridade dada pelo governo ao combate ao crack chegou ao conhecimento dos chefes da maior facção criminosa, que vende a droga nas favelas. Um sinal de que o governo federal vai combater com firmeza o problema pode estar no envio da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) ao Rio, apesar do desinteresse inicial manifestado pelo governo do estado. No domingo fez um mês que integrantes da FNSP – a tropa de elite subordinada ao Ministério da Justiça – ocuparam a comunidade de Santo Amaro, que ainda não foi pacificada, na Zona Sul do Rio. Em um mês de ocupação, a Força Nacional realizou na favela 6.929 abordagens e apreendeu 650 papelotes de cocaína, 1513 pedras de crack, 840 gramas de maconha. Além disso, foram recolhidas munições, explosivos e armas.
Durante 180 dias, serão realizadas ações de polícia ostensiva, judiciária, bombeiros e perícia, em apoio às Secretarias de Saúde, Assistência Social e de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, nas áreas onde serão desenvolvidas as ações de implantação do Programa Crack, é Possível Vencer.
Nas favelas de Manguinhos, traficantes foram informados que a área poderia ser ocupada pela Força Nacional se o crack não fosse retirado de lá. Isso pode ter motivado a decisão dos traficantes. A decisão agradou muitos moradores da favela Mandela. Eles são testemunhas diárias do estrago causado pelo crack na comunidade. No Jacarezinho é possível ver usuários de crack na entrada da favela, mesmo por quem passa no asfalto. As operações policiais têm sido recorrentes, mas o problema está longe de ser resolvido.
Há três anos fazendo trabalhos sociais na favela Mandela, o líder da Rio de Paz, Antônio Carlos Costa, afirma que tem visto a tragédia causada pelo crack na comunidade. Ele lembra que já teve que solicitar ajuda da Justiça para levar a um abrigo três crianças que eram abandonadas pelos pais, usuários de crack. A ONG Rio de Paz, que nasceu envolvida com a redução de homicídios, tem um projeto social, que prevê a construção de uma padaria-escola e o apadrinhamento de crianças por famílias de classe média até a universidade.
— Eu fumo para deitar e acordo para fumar. – diz usuária de crack, moradora da favela Mandela, no depoimento registrado em vídeo por Antônio Carlos Costa ao final da reportagem. – Uma droga maldita. – ela confessa.
E a promessa cumpre-se...
Foto: Divulgação.
“Confesso que fiquei profundamente emocionado ao ler no Globo de hoje (20) informação a respeito de uma séria decisão tomada pelos traficantes de drogas no Rio de Janeiro. (...) Pelo que entendi, eles ficaram muito comovidos com a campanha do Governo Federal a respeito da droga e com o programa Crack, é possível vencer. Não está muito bem explicado no jornal, mas imagino que os bandidos resolverem fazer um tipo de parceria com as autoridades: o governo entra com a campanha contra o crack e eles continuam a vender apenas maconha e cocaína. Uau! Quanta bondade, cuidado, e delicadeza para com a juventude brasileira. Crack, aqui, não! Só na favela ao lado...”.
Gutenberg J.
Jornalista Brasileiro, em postagem no Blog Laudaamassada, publicada no dia 20 de junho de 2012.
No dia 30 de julho, a TV árabe Al-Jazeera divulgou que os traficantes do Rio de Janeiro deixaram de vender crack: “O jornalista Gabriel Elizondo da TV árabe mostrou como é a vida dos viciados brasileiros e entrevistou bandidos que vendem a droga nas favelas Mandela e Antares na capital fluminense. Segundo informações da reportagem, os chefes do tráfico ordenaram o fim da venda do crack nas duas favelas porque os viciados levam muita destruição para as comunidades, apesar da venda dessa droga fornecer muitos lucros. Os traficantes também disseram para o jornalista da Al-Jazeera que ainda controlam as favelas e estão ganhando muito dinheiro com a venda de maconha e cocaína...” – (IAnotícia).
Fico a imaginar uma charge retratando traficantes sentando numa mesa de negociação com la presidenta Dilma Rousseff, o ministro da Justiça Eduardo Cardozo, à cuja pasta está subordinada a FNSP, e os respectivos secretários de Segurança do Estado e do Município do Rio de Janeiro, bem como demais autoridades empenhadas no combate ao crack. Isso sem falar que – não duvido nada –, do jeito que brasileiro é, já deve ter tido até quem rezou um terço – quiçá todo o rosário! –, agradecendo a suposta caridade cristã das versões mal adaptadas de Robin Wood nas favelas cariocas. Enfim! Vejamos como tudo começou...
Os descaminhos do crack:
“Um paciente meu me disse: ‘o crack é a estação final. Quem fuma não é mais dono de nada’...”.
Maria Thereza de Aquino
Professora de psiquiatria da Universidade Estadual do Rio de janeiro - Uerj e ex-diretora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas - Nepad ligado à Uerj, analisando o imenso poder de apelo da droga.
Segundo o site oficial do programa Crack, é possível vencer, a droga “surgiu nos Estados Unidos na década de 1980 em bairros pobres de Nova Iorque, Los Angeles e Miami” – só podia ser... O seu “baixo preço e a possibilidade de fabricação caseira” teriam, portanto, atraído “consumidores que não podiam comprar cocaína refinada, mais cara e, por isso, de difícil acesso” – acesso esse que foi extensivo “aos usuários de cocaína injetável, que viram no crack uma opção com efeitos igualmente intensos” aos da droga que já consumiam, o seu baixo custo e a garantia de não serem contaminados pelo vírus HIV, que, à época, já havia se tornado uma epidemia. No Brasil, por sua vez, o crack debutou no início da década de noventa, inicialmente disseminando-se em São Paulo para, não demorou muito, se espalhar pelo país. No quesito fatores de risco, a “curiosidade pela experiência, influência do meio e de questões psicológicas e sociais são algumas situações que podem levar ao consumo do crack. Droga de efeito rápido e intenso, o crack leva o usuário rapidamente à dependência e, por isso, é fundamental prevenir o seu consumo”. O nome da droga, por sua vez, “vem do barulho que as pedras fazem ao serem queimadas durante o uso”, diz o químico Adriano Maldaner, perito criminal da Polícia Federal.
Festa na floresta?
No Brasil, consumidores de crack têm o costume de chamar uns aos outros de sacizeiros... Sobrou para o presepeiro Saci – uma das principais personagens do folclore brasileiro, cujo desenrolar das suas hilariantes histórias tem como cenário as matas tupiniquins. Que o digam o escritor Monteiro Lobato (1882 - 1948) e o multifacetado Ziraldo!
Enfim! Quem tiver interesse em conhecer o que vem a ser o programa do governo federal Crack, é possível vencer, além de informações a respeito da droga, da sua composição, do seu consumo, da sua ação no organismo humano, bem como algumas das suas verdades e mitos, é só clicar no link abaixo:
Porém, para quem desejar acessar diretamente na página, bastante elucidativa, por sinal, onde são expostos os principais fatores de risco para o uso do crack, basta clicar:
⇒ Depoimento em vídeo de uma usuária de crack, moradora da favela Mandela, concedido ao presidente da ONG Rio de Paz, Antônio Carlos Costa, divulgado ao final da reportagem Tráfico proíbe a venda de crack em favelas do Rio, divulgada pelo portal Anselmo.com no dia 19 de junho e transcrita nesta postagem por este blog:
* O arquivo do conteúdo desta postagem estava pronto há pouco mais de dois meses, mas, não sei por qual motivo, ele simplesmente desapareceu das minhas pastas. Porém, hoje, ao fazer uma varredura no meu computador, encontrei-o, por acaso, mesclado noutro arquivo. De qualquer modo, como o assunto continua atual, resolvi postá-lo, acrescentando, contudo, informações outras, atualizando-o.
Nathalie Bernardo da Câmara
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