quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

O RENDEZ-VOUS DE LAS PRESIDENTAS



Dilma Rousseff e Cristina Kirchner “são mulheres revolucionárias...”.

Hebe de Bonafini, ativista argentina pelos direitos humanos, líder das Mães da Praça de Maio, que, desde 1977, protestam contra o desaparecimento dos seus filhos durante a ditadura militar (1976 - 1983) do seu país, após a reunião, que ela classificou de “bela”, ocorrida no dia 31 de janeiro, com la presidenta brasileira.



Sem querer entrar no mérito da referida declaração, sobretudo em respeito a sua autora e porque cada um tem o direito de ter o seu entendimento do que pode vir a ser revolução, no caso, do que seja um agente revolucionário, o encontro relâmpago, embora reservado, de las presidentas Dilma Rousseff e Cristina Kirchner foi recheado de simbolismos. Segundo Rousseff, a escolha pela Argentina como o primeiro destino a ser visitado por ela na condição de presidenta deu-se em função de ambos os países serem cruciais para fazer do séc. XXI o século da América Latina. Para ela: “Somos países com grande potencial agrícola, grande potencial energético, estruturas industriais, e, ao mesmo tempo, países também com uma capacidade grande de gerar tecnologia, ciência e, portanto, inovação”.

Na reunião de Rousseff com as resistentes da Praça de Maio, por sua vez, seguida do encontro privado com Kirchner, um apelo das argentinas, ou seja, que o Brasil abra os arquivos da ditadura militar no Brasil (1964 - 1985). Para uma das líderes do movimento porteño, Estela Barnes de Carlotto, se faz necessário um levantamento do número de desaparecidos políticos nas décadas que compreendem o regime dos militares brasileiros. Por fim, democratizando a troca de figurinhas, las presidentas reuniram-se com ministros argentinos e os da comitiva brasileira, no total de oito. Quais foram? Mero detalhe... Enfim! Um balanço inicial da visita oficial de Rousseff à Kirchner é o de que declarações e acordos foram assinados, contemplando direitos humanos, ciência e tecnologia, comércio, habitação e construção civil.

Tendo em vista, ainda, avanços na relação bilateral entre os dois países, os beneficiando e fortalecendo uma aliança, um dos quatorze acordos assinados objetivou a construção de dois reatores nucleares para fins pacíficos. Para Rousseff, “o governo brasileiro assume, uma vez mais, o compromisso com o governo argentino de uma política conjunta na estratégia de desenvolvimento da região”, afirmando, ainda, após ressaltar que ela e Kirchner haviam sido eleitas pelo voto direto, que uma sociedade só pode ser medida pelo seu avanço e modernidade desde que, sem discriminação, também assegure a participação das mulheres nesse mesmo avanço e modernidade – parece até que la nostra presidenta andou lendo a educadora, escritora e feminista brasileira Nísia Floresta Brasileira Augusta (1810 - 1885)...

Afinal, em 1853, a minha biografada, Nísia Floresta, disse: “Sabemos que muitos anos, séculos talvez, serão precisos para desarraigar herdados preconceitos a fim de que uma tal metamorfose se opere. Esperamos somente que os zelosos operários do grande edifício da civilização em nossa terra atentem para os exemplos que a História apresenta do quanto é essencial aos povos, para firmarem a sua verdadeira felicidade, o associarem a mulher esse importante trabalho.”



(Passagem extraída do texto Nísia Floresta: lendas & mitos, de minha autoria, publicado neste blog no dia 12 de outubro de 2009, ao mesmo tempo transcrito do jornal O Galo. Ano XIV, n° 7, Fundação José Augusto, Departamento Estadual de Imprensa do Rio Grande do Norte, Natal-RN, julho 2002).





Por fim! Um dia antes da viagem a Argentina, em declarações a jornais porteños, Rousseff admitiu divergências entre ela e o Itamaraty, decorrentes das declarações que fez a favor da libertação da iraniana Sakineh Ashtiani, condenada à pena de morte pelo governo do Irã, garantindo que não fará concessões aos direitos humanos. Isso porque, dias antes, a deputada Zohreh Elahian, presidenta do Comitê de Direitos Humanos da Assembléia Consultiva do Irã, enviou para ela uma carta, na qual tentou explicar a situação de Sakineh, embora não confirmada pelas demais autoridades do seu país. À ocasião das declarações, Rousseff também afirmou que a tragédia que abateu o Rio de Janeiro teria sido o momento mais difícil do início do seu governo – até então, obviamente, nenhum apagão de energia elétrica...

De qualquer modo, se o séc. XXI será ou não o da América Latina, como ela pretende, justificando a sua escolha pela Argentina como o seu primeiro tour internacional, sobretudo por este país ser o principal parceiro comercial do Brasil no Mercosul e um dos maiores do mundo, atrás somente da China e dos Estados Unidos, é sentar e esperar. Vendo para crer, como diz o mais cético dos mortais. Sem falar que a opção de Rousseff é capaz de minimizar o amargor de certos políticos argentinos por seu país não ter sido incluído no roteiro da viagem que, em março, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, fará a América do Sul, quando visitará o Brasil, o Chile e El Salvador. Ora! Que a Argentina sentisse era alívio por não ter o desprazer de receber o atual representante de um governo amante da guerra.

Infeliz, eu diria, é o povo brasileiro, que terá de engolir os seus governantes paparicando um presidente norte-americano. Hélas! Mas, como parece não importar quem lava a mão de quem... O fato é que o Clarín lembrou: Kirchner não compareceu à posse da brasileira no dia 1° de janeiro. Generosa, ai, ai, ai, Rousseff! Então? Las respectivas presidentas, apesar das diferenças, já podem ser consideradas compañeras y amigas? Cada um que tire as suas próprias conclusões. E, como já o disse o referido jornal argentino, destacando que, apesar das tensões, o encontro do dia 31 de janeiro serviu e servirá para mostrar “que tipo de química existe” entre as duas. Sei não, mas, enquanto Rousseff diz defender a liberdade de expressão e de opinião, Kirchner sequer dirige-se à imprensa, a ponto, como mostra a charge, de ignorá-la...


Nathalie Bernardo da Câmara


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