30 de março de 2014
Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
Nessa batida a coisa
vira rotina: de agosto de 2013 para cá foram seis os deputados federais com
prisão decretada pelo Supremo Tribunal Federal. Na média, quase um por mês.
Estatística impressionante se comparada à inexistência de punições do tipo a
contar de 1988, quando a Constituição determinou que o foro de julgamento (dito
privilegiado) de autoridades seria o STF.
O que ocorre? Nada de
excepcional, apenas a fila andou. E lentamente, se considerarmos que levou
pouco menos de 12 anos entre a mudança da lei que confundia imunidade com
impunidade e as primeiras punições efetivas no que diz respeito a integrantes
do Congresso Nacional.
Mas, diante do que
ocorria até novembro de 2001, antes tarde do que nunca. O constituinte de 88
assegurou a inviolabilidade dos votos e da palavra dos parlamentares, mas a
estendeu aos crimes comuns, pois os processos eram automaticamente suspensos
mediante a diplomação do eleito. Se o crime fosse cometido no exercício do
mandato, o STF precisaria de autorização do Legislativo para abrir uma ação.
Os tempos eram outros, a
sociedade menos vigilante, o espírito de corpo mais atuante e, com isso, a
autorização nunca era concedida. Já houve casos de senadores suspeitos de
tráfico de drogas, homicídios, desvios de verbas públicas e uma série de
crimes, cujos pedidos do Supremo foram simplesmente arquivados sem maiores
explicações.
O aumento dos escândalos,
no entanto, fez crescer a pressão sobre o Legislativo e finalmente, no fim de
2001, foi promulgada a emenda 35 ao artigo 53 da Carta, que inverte a situação
anterior. Hoje, o STF inicia o processo e, se o Congresso quiser impedir,
precisa aprovar por maioria a suspensão da ação. Um desconforto, no mínimo.
Os seis parlamentares
condenados podem representar um número significativo se comparados à situação
de impunidade total. Mas representam quase nada diante das 834 ações ou
inquéritos que, segundo levantamento feito pelo Estado em
novembro do ano passado, tramitam no Supremo Tribunal Federal contra políticos.
Em 36% delas existem
indícios de crimes como lavagem de dinheiro, desvio de recursos, falsidade
ideológica e homicídio.
Leite derramado. O que
a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a devolução do processo do tucano
Eduardo Azeredo à primeira instância, devido à renúncia ao mandato de deputado
federal, ensina aos condenados do mensalão é que excesso de confiança nem
sempre é bom conselheiro.
Mesmo levando em conta
que a composição da Corte na época era outra, o placar de 8 a 1 em relação a
Azeredo autoriza a suposição de que, se os deputados mensaleiros tivessem
renunciado aos mandatos antes do início do julgamento, a ação penal 470 não
seria examinada pelo STF, que remeteria os autos ao foro de origem.
Mas, os réus preferiram
confiar em dois fatores. No campo político, na influência de Luiz Inácio da
Silva. No âmbito jurídico, seguiram a tese defendida por Márcio Thomaz Bastos
quando ainda ministro da Justiça, segundo a qual o que houve foi crime
eleitoral.
O foro privilegiado dos
deputados e o não desmembramento do processo foram o que manteve o caso no
Supremo. Sem possibilidade de recurso.
Oferta e procura. Isolado,
o índice de 36% de avaliação positiva do governo não é motivo para a oposição
se entusiasmar desde já. O então presidente Lula tinha pouco mais que isso no
início de 2006 e ganhou a eleição.
Mas, aqui, entram outros
fatores que fazem a diferença. O primeiro, as "curvas". Desde
novembro do ano anterior Lula vinha em rota ascendente nas pesquisas; a
trajetória de Dilma é descendente.
O segundo, o anseio do
eleitor. Em 2002, havia o desejo de mudança; deu oposição. Em 2006 e 2010, a
demanda do eleitorado era por continuidade; deu governo. Em 2014, diante da
procura por mudança, o marketing tentará "ofertar" a presidente na
moldura da transformação.
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