terça-feira, 11 de agosto de 2009

ONDAS E ONDAS...

“O mar cria as ilusões, a onda as questões, o surf as respostas...”.

Breno Rigaud



O município de Baía Formosa, no litoral sul do Rio Grande do Norte, distante de Natal cerca de cem quilômetros, acordou, no último sábado, 8 de agosto, surpreendida com uma ação policial inesperada, cujo objetivo era o da apreensão de drogas na cidade, que, aliás, acarretou em diversas prisões – prática, aliás, comum em vários pontos do país. A referida ação, contudo, pecou por ser batizada de Operação Ondas Limpas, alusão a um campeonato de surf que iria ter início horas depois, como se a droga apreendida, sobretudo crak, fosse escoada durante o tal campeonato na cidade, cujas ondas são internacionalmente conhecidas como um point da modalidade esportiva.

Não se questiona, aqui, o mérito da Operação Ondas Limpas, mas o fato das autoridades policiais associarem-na a uma das poucas atividades saudáveis praticadas em Baía Formosa, que, ao longo dos anos, vem propiciando esporte e lazer aos jovens da cidade e evitando que esses mesmos jovens tornem-se consumidores e dependentes de drogas como as que foram apreendidas. Agora, se querem mesmo limpar as ondas de BF, nome carinhoso dado a Baía Formosa, que as autoridades – no caso, as sanitárias – comecem pelos esgotos que, a céu aberto, aos olhos de todos e vergonhosamente, são despejados na baía que dá nome ao município e que é o mais belo dos seus cartões postais.

Afinal, apesar de sanear o nosso olhar, ofertando-nos uma paisagem mais que peculiar, com os barcos ancorados em suas águas, cujo movimento transforma o rumor das suas ondas em uma melodiosa e harmônica sinfonia, a baía – a única existente no Rio Grande do Norte – é a fiel depositária dos esgotos de Baía Formosa, que não dispõe de saneamento básico – uma triste ironia! – e vive um esgotamento sanitário, segundo a Confederação Nacional de Municípios. O banho de mar na baía, por exemplo, em função da poluição, é considerado um dos mais impróprios. E não somente por causa dos esgotos, mas, também, pelo lixo que, aliás, os próprios moradores insistem em jogar por toda parte.

Se querem mesmo limpar as ondas de BF, que as autoridades sanitárias coibam com firmeza o lançamento ao mar e aos rios de dejetos de uma indústria de mineração que explora areias monazíticas na região, sobretudo os dejetos do mercúrio, usado na fabricação de termômetros, lâmpadas, medicamentos... No caso dos medicamentos, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil há anos já determinou a retirada do mercado de todos os medicamentos à base de mercúrio. Os anti-sépticos, por exemplo. O mercúrio, portanto, pode ser altamente tóxico quando absorvido por inalação, ingestão ou em contato com a pele. E dejetos desse minério estão nas ondas de BF.

Os dejetos do mercúrio no mar e nos rios provocam, ainda, efeitos devastadores no meio ambiente e no organismo humano, já que algumas bactérias agem sobre o metal, transformando-o em substâncias tóxicas, que contaminam a flora e a fauna aquáticas, que, por sua vez, contaminam as pessoas que delas se alimentam, podendo, inclusive, causar uma doença cerebral, chamada Mal de Minamata, nome de uma cidade japonesa onde, em 1956, o primeiro caso da doença foi diagnosticado, bem como intoxicações que levam à morte. Daí que para os dejetos do mercúrio no mar e nos rios da região, além dos esgotos lançados na baía, aí sim, deveria ser constituída uma força tarefa que proibisse tais abusos. É essa a poluição que preocupa...



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UM POUCO DE HISTÓRIA


"Com os papagaios aprende-se que muitos são os que falam,
mas poucos os que sabem o que dizem...".

José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta
Terra Papagalli

Os índios Potiguaras chamavam o lugar de Aratipicaba, que, em Tupy, significa Bebedouro dos Papagaios, ou, ainda, Tanque dos Papagaios. Segundo a tradição oral, tal batismo deu-se porque os papagaios costumavam beber a água doce dos olheiros das praias da região, sobretudo na praia de Bacopari. O curioso é que, nos dicionários de Tupy consultados, encontramos dois significados para o nome Bacopari: depósito de água – seria em função dos olheiros? – e fruto cercado de pontas e asperezas, já que, de fato, existe uma árvore e uma fruta com esse nome na Mata Atlântica. No caso de Baía Formosa, valem os dois significados.

Sim, da mesma forma que os olheiros de água doce existiam em abundância na tal praia, o formato da outrora floresta era o de uma estrela de cinco pontas. Assim, as extremidades da praia seriam duas das cinco pontas da estrela. Daí a floresta encontrada pelos seus primeiros habitantes brancos ter recebido o nome de Mata Estrela. – hoje, infelizmente, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, com apenas 2.039,93 hectares (1.888,78 de floresta; 81,64 de dunas e 69,73 de lagoas, em número de dezenove), cerca de insignificantes 3% do que ela já foi um dia.

Mesmo assim, a Mata Estrela é, ainda, a maior reserva de Mata Atlântica sobre dunas do Rio Grande do Norte. E isso só foi possível porque, em 1990, através de uma Portaria Estadual, a floresta foi tombada e, em 2000, transformada, por Decreto Federal, em Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN, já que não deixa de ser uma propriedade privada, pertencente à Destilaria Baía Formosa S/A, responsável pela atividade econômica mais rentável do Município, que é a monocultura da cana-de-açúcar, seguida da pesca e da produção agrícola.

No séc. XVI, contudo, o lugar já recebia a visita de naus portuguesas e francesas, sendo apenas em 1612 que os colonizadores lusitanos denominaram mais um dos seus "achados" de Bahia Formosa, que, pouco mais de dois séculos depois, quando deram por encerrada a extração da mais cobiçada árvore da época, o Pau-Brasil, transformou-se em zona de pesca. Em 1892, tornou-se Distrito de Canguaretama; em 1953, Vila. Porém, a data mais comemorada pelos formosenses é 31 de dezembro, já que, nesse mesmo dia, no ano de 1958, Baía Formosa foi elevada à condição de município.

E como fazer para chegar nesse cantinho aparentemente esquecido do Rio Grande do Norte, antes da chegada, obviamente, de novos portugueses – historicamente, sempre aliados dos ingleses –, que insistem no mesmo erro dos seus antepassados, que se achavam os "donos" da Terra dos Papagaios, primeiro nome dado ao, hoje, Brasil? Vindo pelo asfalto, de Natal ou de João Pessoa, pela BR 101, seguindo, depois, pela RN 062; pela praia, vindo de Barra de Cunhaú, no Rio Grande do Norte, ou de Mataraca, na Paraíba, de buggy ou de jipe; pelo mar, de barco ou de navio. E que mar!

Um mar que encanta moradores do Município – cerca de 8.000 habitantes, segundo os cálculos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, realizados em 2001, mas, também, todos aqueles que visitam o lugar, fazendo a delícia dos surfistas, que consideram o Pontal um dos melhores points do Nordeste, lembrando que um dos atrativos de Baía Formosa é o povoado de Sagi. O fato é que somente conhecemos as belezas de Baía Formosa se a visitarmos. Enfim, Baía Formosa, pelo menos, para mim, é a dona das praias mais charmosas do Rio Grande do Norte. Tenho dito.

(Transcrito: A Bagagem do navegante, 27 de fevereiro de 2009).



Nathalie Bernardo da Câmara
Registro profissional de jornalista:
578 - DRT/RN, desde 1989

Um comentário:

  1. Apoiada em número, gênero e grau. Como sempre, linda ao teclado. Quando eu crescer, quero ser igual a você (já disse isso?).

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