domingo, 24 de junho de 2012

CARTA DA TERRA: A ESOFAGITE DO CAPITALISMO

“A transição para uma economia de baixo carbono é capaz de compatibilizar seu crescimento com a preservação dos serviços ecossistêmicos básicos...”.

Ricardo Abramovay
Economista brasileiro


Foi-se o sacerdócio, mas ficou o espírito franciscano. Afinal, como é do seu feitio, acolheu sem aparente vaidade – se tem alguma, não demonstra –, mas com naturalidade e emoção, os aplausos efusivos nas palestras que proferiu; as reverências que, onde quer que fosse, transitando com desenvoltura entre os povos, prestaram-lhes. Não, não é somente o Papa que é pop, Boff também o é. Segundo muitos, a presença do teólogo, escritor e ambientalista brasileiro Leonardo Boff foi a mais esperada, por exemplo, na Cúpula dos Povos, evento paralelo ao oficial, a Rio+20, que teve como palco o Riocentro, por ele, inclusive, criticado, que, inclusive, não vê com bons olhos a maquiagem dada ao que muitos chamam de economia de baixo carbono:

— Só se fala de economia verde. Mas o que eles querem é apenas uma economia pintada de verde. Temos que ter uma ruptura com o sistema atual.

No dia 15, na abertura da Cúpula dos povos, numa das arenas montadas no Aterro do Flamengo, Boff foi um dos que participou do lançamento da Rede Brasileira da Carta da Terra, evento organizado pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS). A Carta da Terra, por sua vez, foi inicialmente elaborada na Eco-92. Em 2000, a sua versão final foi lançada em Haia, na Holanda, sendo adotada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Um dos integrantes da Comissão que elaborou o documento, Boff, segundo a revista Fórum, defendeu os seus princípios, informou sobre a sua importância, ressaltou a necessidade de divulgá-la mais amplamente na sociedade e denunciou:

— A Carta da Terra não é tão divulgada porque ela não é digerível ao estômago do mundo capitalista.

Para ele, o documento, que considera um dos mais belos que já foram elaborados no início do séc. XXI, porque nasceu do grito dos povos, é indigesto ao capitalismo porque expõe as chagas de um sistema econômico caduco e desumano, deixando claramente pontuadas as mudanças necessárias para que conquistemos a realidade que queremos. O futuro que queremos e pelo qual temos de lutar.

Segundo a jornalista Carolina Stanisci, da assessoria de comunicação do IDS e que esteve presente ao evento, uma das muitas provocações, digamos, lúdicas, feitas por Boff foi a de que, por exemplo, “as pessoas vendem a terra, negociam a terra, fazem com a terra o que bem entendem. Com a mãe, não! Ninguém vende a mãe, negocia a mãe, detona a mãe”. De acordo com a reportagem, a socióloga Maria Alice Setubal, membro do IDS, um dos signatários da Carta da Terra, alertou para a importância da sustentabilidade para a educação, podendo ser o documento o mapa e o guia para que as novas gerações tenham “na sustentabilidade o eixo de sua sobrevivência na Terra”. À ocasião, portanto, a socióloga fez um apelo, o de que todos reflitam “sobre a necessidade da construção de ‘um novo paradigma’, porque, segundo ela, o ‘eixo não pode ser mais a economia’, mas ‘o bem-estar da população’”.

Enquanto isso, a promotora Ana Rúbia, da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público do Meio Ambiente (Abrampa), que também contribuiu com a elaboração da Carta da Terra, reforçou o papel do operador do direito, no seu caso o Ministério Público, que, nas palavras da jornalista, seria o de “cuidar da terra em outros quintais: a Justiça”, embora, independentemente disso, a defesa ambiental também é um dever de cada brasileiro, citando, como exemplo, o conceito “berço a berço, segundo o qual nada deve ser jogado fora”. Para a promotora, portanto:

— Jogar fora é jogar dentro. Não existe jogar fora.

Ao final do evento, aplaudido por todos os presentes, o testemunho de quem estava na plateia, o filósofo George Winnik, da Rede Nossa São Paulo, que o definiu como um “momento histórico”.

Enfim! Para quem tiver interesse em assistir a palestra de Leonardo Boff no referido evento, é só clicar no link abaixo:


A íntegra da Carta da Terra, por sua vez, pode ser encontrada no link: http://www.cartadaterrabrasil.org/prt/text.html

Nathalie Bernardo da Câmara

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