quarta-feira, 20 de junho de 2012

OS FILHOS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

A ilustração acima é de uma cena do filme Tempos modernos (1936), do mímico, roteirista, ator, diretor e produtor britânico Charles Chaplin (1889 - 1977), patrocinador, inclusive, de todos os seus filmes. Multifacetado, o artista também compôs a trilha sonora de Tempos modernos e, pela primeira vez, o mundo tem a oportunidade de ouvir a voz de Chaplin no cinema, através, claro, da sua personagem mais emblemática, O Vagabundo – oportunidade na qual deparamo-nos com a sempre surpreendente criatividade daquele que, apesar de se considerar um cidadão do mundo, relutava aderir definitivamente ao cinema falado, permanecendo mudo, embora, através do seu silêncio, tenha tido a capacidade de nos revelar a sua verdadeira essência: o humanismo. Desse modo, apesar de hesitante, transitando entre o cinema mudo e o falado, o que nos deixa impactado é a crítica mordaz e debochada que faz da ascensão do processo de industrialização dos meios de produção, que, com a sua determinação, espezinha com a manufatura, tentando esmagá-la de vez, esmagando, consequentemente, a sua porção humana, o que deivaxa Chaplin, evidentemente, irritadiço.

“Hoje em dia conhecemos o preço de tudo e o valor de nada...”.

Oscar Wilde (1854 - 1900)
Escritor irlandês


Na edição nº 435 da revista Brasil de Fato, que passa a circular nas bancas de 30 de junho a 06 de julho de 2011, a chamada de capa do semanário estampa uma entrevista exclusiva com o sociólogo, escritor e crítico literário brasileiro Antonio Cândido, hoje prestes a completar 94 anos de idade no dia 24 de julho, na qual ele fala “sobre o conturbado século 20, seu método de análise literária, sua militância e sua crença no socialismo, que, para ele, ‘é a grande visão do homem, que não foi ainda superada, de tratar o homem como ser humano’” – entrevista essa cuja íntegra está disponível na versão eletrônica da revista, divulgada no dia 12 de julho de 2011: http://www.brasildefato.com.br/node/6819

Nesta postagem, detive-me apenas numa única resposta do intelectual à jornalista brasileira Joana Tavares, bem como numa fala ou outra solta quando ele tenta explicar a sua concepção de socialismo, “o cavalo de Troia dentro do capitalismo”. Para Antonio Candido, “se você tira os rótulos e vê as realidades, vê como o socialismo humanizou o mundo”. Ou, então, “o socialismo é o máximo de igualdade econômica”, ao mesmo tempo em que critica o comunismo, no qual, em sua opinião, “tem muito fanatismo” – aí, me instigou... Fanatismo? Sinceramente – e digo isso na condição de quem já foi militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), mas que, por questões de divergências internas em relação à postura do partido em determinados períodos históricos, sai, a exemplos de muitos outros, das suas fileiras – o que não significa que eu tenha deixado de ser comunista. O único problema, contudo, é a distorção que se fez e continua se fazendo da ideia original do comunismo, acrescentando aí a minha visão de se chegar a esse regime por vias pacíficas. Não armadas! Uma utopia? Romantismo da minha parte? Bom! Vamos à parte que, de certa forma, considerei pertinente na fala de Antonio Candido e que me instigou a transcrevê-la:

— O que é o socialismo? É o irmão-gêmeo do capitalismo, nasceram juntos, na revolução industrial. É indescritível o que era a indústria no começo. Os operários ingleses dormiam debaixo da máquina e eram acordados de madrugada com o chicote do contramestre. Isso era a indústria. Aí começou a aparecer o socialismo. Chamo de socialismo todas as tendências que dizem que o homem tem que caminhar para a igualdade e ele é o criador de riquezas e não pode ser explorado. Comunismo, socialismo democrático, anarquismo, solidarismo, cristianismo social, cooperativismo... Tudo isso. Esse pessoal começou a lutar, para o operário não ser mais chicoteado, depois para não trabalhar mais que doze horas, depois para não trabalhar mais que dez, oito; para a mulher grávida não ter que trabalhar, para os trabalhadores terem férias, para ter escola para as crianças. Coisas que hoje são banais. Conversando com um antigo aluno meu, que é um rapaz rico, industrial, ele disse: “o senhor não pode negar que o capitalismo tem uma face humana”. O capitalismo não tem face humana nenhuma. O capitalismo é baseado na mais-valia e no exército de reserva, como Marx definiu. É preciso ter sempre miseráveis para tirar o excesso que o capital precisar. E a mais-valia não tem limite. Marx diz [no livro A Ideologia alemã]: as necessidades humanas são cumulativas e irreversíveis. Quando você anda descalço, você anda descalço. Quando você descobre a sandália, não quer mais andar descalço. Quando descobre o sapato, não quer mais a sandália. Quando descobre a meia, quer sapato com meia e por aí não tem mais fim. E o capitalismo está baseado nisso. O que se pensa que é face humana do capitalismo é o que o socialismo arrancou dele com suor, lágrimas e sangue. Hoje é normal o operário trabalhar oito horas, ter férias... Tudo é conquista do socialismo.

Na sequência, transcreverei uma entrevista publicada no dia 05 de fevereiro deste ano pela revista Carta Maior com o filósofo francês Alain Badiou, “um homem que não teme riscos: nunca renunciou a defender um conceito que muitos acreditam ter sido queimado pela história: o comunismo”. E do resgate do amor num mundo, segundo ele, dominado pela mais-valia...


Nathalie Bernardo da Câmara


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