8 de abril de 2014
EVERTON DANTAS – Novo Jornal
Uma
tempestade está a caminho de Natal. Segundo um professor chamado Marcio Araújo,
que assina como chefe do departamento de Geografia e Metereologia da UFRN, “a
mídia está querendo minimizar a situação para não haver pânico”. Palavras do
professor: “A tempestade está vindo! A Emparn não quer divulgar os dados
corretos para não causar caos na população! Mas a verdade é que estão previstos
ventos de 200 km/h”.
Assim como essa
tempestade, o Brasil também é um país favorável ao estupro. Pesquisa
recém-publicada, pelo IPEA, mostrou que a população brasileira é amplamente
favorável ao estupro de moças que estejam usando roupas insinuantes. Agora,
imagine a pesquisa: o entrevistador para na frente de uma pessoa e pergunta (a
uma mulher, digamos): “por favor, a senhora acha que uma moça que se veste de
maneira insinuante merece ser estuprada?”. A entrevistada, de pronto, responde:
“Sim”. Dá para imaginar uma cena assim ou algo perto disso? Lembra algumas
pegadinhas que estão bastante populares na internet e nas quais o “repórter”
pergunta a entrevistados o que “eles acham sobre os males do twitter”? Sem
saber do que se trata, as pessoas são levadas a pensar que, na realidade,
“twitter” é algum tipo de droga, como o crack. E dão respostas que – para
alguns – podem até ser engraçadas, mas não o são, na realidade. Trata-se da
pura exploração da falta de educação alheia, algo que não pode ser motivo de
riso em canto nenhum do mundo, posto que de ignorância todos nós temos um poço
profundo. Mas, voltando à pesquisa sobre o estupro, sendo entrevistado,
recusaria a responder algo do tipo e o resto da pesquisa inteira, reação que
considero comum para grande parte da população. Da mesma maneira: dá para
imaginar um chefe de departamento de Geografia fazendo um alarde desses via
WhatsApp?
Esses são apenas dois
exemplos recentes de como, atualmente, a falta de preocupação em duvidar de
informações postas sobre assuntos de interesse geral pode nos levar a erro
sobre questões importantes para a nossa sociedade e/ou à preocupação sem
necessidade.
O que impressiona,
realmente, é como - cada vez mais rápido - embalados a milhares de bits por
segundo, estamos ficando cada vez mais informados sobre informações que não são
exatamente o que deveriam ser. E mais importante: parece que essas informações
têm o poder de chamar a atenção e se tornar o grande assunto, a notícia do dia.
É claro que há diferenças nos dois exemplos citados.
No caso do IPEA,
primeiro, é preciso parabenizar o órgão sim! Por ter vindo a público admitir o
erro e chamar a atenção para a correção. É claro, isso não desfaz o erro. Mas
mostra a preocupação com o assunto. Não deixa de dar certa credibilidade, a
exemplo do Correio Brasiliense, que em determinado ano admitiu o erro na capa e
marcou um gol no jornalismo. Da pesquisa do IPEA, o que impressionou mesmo foi
ninguém ter duvidado dos resultados, da situação surreal que se apresentou ali
nas televisões e jornais.
Do outro caso,
impressiona do mesmo jeito como a maioria não desperta para o fato de que se
realmente uma tempestade dessas estivesse a caminho de Natal todas as
precauções seriam tomadas e alardeadas porque ventos de 200 quilômetros por
hora não deixariam intactas as moradas daqueles que decidem os destinos de
nossas vidas mortais e residem ali em frente à praia de Miami.
Só a título de
informação, um furacão só pode ser chamado assim quando atinge ventos de 119
km/h. Um vendaval vai até os 150. Ou seja, uma tempestade de 200 km/h em Natal
simplesmente inauguraria uma nova nomenclatura nos tipos de vento, além de
arrasar a cidade. Seria político voando pra tudo quanto é lugar.
Voltando ao que parece
sério, cada vez mais se faz importante praticar o ato da dúvida, para não
naufragar nesse mar de informações que recebemos diariamente, posto que a cada
minuto imergimos mais nesse universo social virtual que instate a instante se
torna mais sólido e real.
Numa era na qual
“todos podem ser jornalistas” falta – em demasia – a aplicação de uma prática
(ou duas) essencial ao exercício dessa profissão (?): a checagem. Princípio que
consiste em sempre desconfiar de tudo que está posto e nos impele a verificar a
verdade dos fatos. E só após isso passar a ter aquilo como notícia. Divagando
um pouco mais, talvez seja exatamente isso que mais incomode nessa área que tanto
tem apanhado de um lado e de outro: o fato de que por mais “nazi” que seja o
jornal, se for um profissional qualificado, ele sempre vai fazer essa checagem.
E hoje em dia, em ano eleitoral pós-black blocs, à esquerda e à direita, não há
muitas pessoas interessadas em ler/ouvir alguma verdade que não seja a
sua.
A continuar assim, não
há como duvidar que realmente, uma tempestade muito pior, sem vento algum,
atingirá o mundo inteiro, não só Natal. Ou pior: talvez essa tempestade já
esteja sobre nós, mas ainda está só começando.
O Jornalista
Everton Dantas escreve uma coluna às terças-feiras no NJ.
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