terça-feira, 17 de abril de 2012

O PILAR MARXISTA DA EDUCAÇÃO LIBERTADORA

“Ensinar o povo a ver criticamente o mundo é sempre uma prática incômoda para os que fundam os seus poderes sobre a inocência dos explorados...”.

Paulo Freire (1921 - 1997)
Educador, filósofo marxista e patrono da educação brasileira (lei de 13/04/2012).


No dia 26 de novembro de 2009, durante o Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica, promovido pelo Ministério da Educação, embora mediante a aprovação por unanimidade da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, foi declarada a anistia do educador Paulo Freire, cujo único crime que cometeu foi o de tentar educar o oprimido povo brasileiro. Bom! O fato é que a anistia fez parte de um pacote. À ocasião, o então presidente da referida comissão, que, aliás, continua a exercer as funções do cargo até hoje, além de ser o atual secretário nacional de Justiça, o advogado Paulo Abrão Pires Júnior, não somente pediu perdão à viúva do pedagogo, Ana Maria Araújo, como também lhe concedeu uma indenização de 480 salários mínimos, desde que respeitado o teto de R$ 100 mil – boa ação essa, digamos assim –, que se justificaria pelo reconhecimento dos erros – não teriam sido crimes? – do Estado brasileiro cometidos contra Paulo Freire durante a ditadura militar no país (1964 - 1985), como se estivesse, com esse argumento delirante, se redimindo das faltas alheias. A viúva de Freire, por sua vez, foi realista. Em poucas palavras, ela limitou-se a dizer que o regime militar o atingiu “violentamente e com malvadeza”, destruindo a sua natureza, o seu corpo e a sua cidadania. Porém, não se dando por satisfeito, o presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça chegou ao cúmulo de ainda dizer, na audiência pública durante a qual se deu o fato, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, que, finalmente, [pelo menos] a cidadania de Paulo Freire havia sido retomada e proclamada como ele merecia.

Eu, hein! Parece até que Paulo Abrão estava sob o efeito de um alucinógeno qualquer quando proferiu tamanho disparate. Afinal, convenhamos, é humanamente impossível, para não dizer fora do contexto – a não ser em filmes de ficção – alguém retomar a sua cidadania depois que morre. Isso sem falar que anistia póstuma soa de certa forma estranha, como se só alimentasse o ego de quem a concedeu, ou melhor, prestou um favor... Enfim! Toda essa introdução para dizer que, sancionada por la presidenta Dilma Rousseff na sexta-feira, 13, a lei nº 12.612, de 13 de abril de 2012, que decreta Paulo Freire como patrono da educação brasileira, foi publicada nesta segunda-feira, 16, no Diário Oficial da União. Criador de um método revolucionário de alfabetização de adultos, que, inclusive, leva o seu nome e já foi adotado por diversos países, mas também conhecido como pedagogia da libertação, que tinha como proposta uma educação crítica a serviço da transformação social, Paulo Freire formou-se em direito, embora nunca tenha exercido a profissão, optando por dar aulas de língua portuguesa numa escola de segundo grau – foi o seu batismo, digamos assim, naquela que viria a ser o seu leitmotiv durante toda a sua vida, ou seja, a educação. Em 1947, quando assumiu o cargo de diretor de educação do Serviço Social da Indústria - Sesi em Recife, passou a focar os seus interesses e pendores pela alfabetização de adultos e pela educação popular. Na década de 1950, além de professor, se tornou doutor em filosofia e história da educação, passando a atuar, já no início da década de 60, em movimentos sociais.

Exemplo disso foi quando, em 1962, então diretor do Departamento de Extensões Culturais da Universidade do Recife, Paulo Freire criou o seu método de alfabetização de adultos. Formando um grupo, ele se deslocou para o município de Angicos, no Rio Grande do Norte, onde, em apenas 45 dias, alfabetizou 300 cortadores de cana. Detalhe: todo o processo durou somente 40 horas de aula e sem cartilha, que ele não costumava adotava. Assim, não demorou muito e coube a Paulo Freire a missão de coordenar o Plano Nacional de Alfabetização proposto durante o governo do presidente João Goulart (1919 - 1976), cuja meta era a de alfabetizar cinco milhões de brasileiros. Porém, com Jango sendo deposto pelo golpe militar de 1964, Paulo Freire foi preso e exilado, se tornando um educador errante no mundo: morou na Bolívia, no Chile, nos Estados Unidos e na Suíça. No entanto, foi no Chile que, em 1968, ele escreveu a sua obra mais conhecida, A pedagogia do oprimido. Na década seguinte, a de 70, ampliou os seus conhecimentos de geografia e passou a desenvolver atividades educacionais e políticas em diversos países da África, Ásia e Oceania, retornando ao Brasil apenas em 1980, quando o então presidente João Baptista Figueiredo (1918 - 1999) deu início, com a abertura, ao processo de redemocratização do país. Considerado um dos principais pensadores da história da pedagogia mundial, Paulo Freire tornou-se doutor honoris causa de dezenas de universidades internacionais, além de ter recebido uma considerável quantidade de prêmios no Brasil e no exterior por sua exemplar atuação não importa qual área atuasse.

Pois é, as homenagens... Não que elas não devam ser outorgadas postumamente, mas, convenhamos, melhor é quando o são em vida. Enfim! Em 1996 – ele morreria no ano seguinte –, Paulo Freire, sempre emblemático e no auge dos seus 75 anos de idade, declarou: — Se a educação não é capaz de mudar a sociedade, sem ela tão pouco a sociedade muda.



Nathalie Bernardo da Câmara


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