RESPEITEMOS AS DIFERENÇAS:
NÃO À DISCRIMINAÇÃO!
“Liberdade não é meramente tirar as correntes de alguém, mas viver de uma forma que respeita e aumenta a liberdade dos outros...”.
Nelson Mandela
Advogado e ativista político sul-africano
Prêmio Nobel da Paz de 1993
Outro dia – não por acaso –, relendo uma entrevista que foi concedida pela ex-ministra do Meio Ambiente e ex-candidata à presidência da República Marina Silva ao Congresso em Foco durante a campanha para as eleições de 2010, o tema preconceito e discriminação levantado pelo jornalista Rudolfo Lago ao longo do bate-papo com a sua entrevistada instigou-me a escrever a respeito, sobretudo porque, de há muito, eu venho querendo abordá-lo neste blog. Enfim! A diferença entre preconceito e discriminação é gritante. Porém, a maioria das pessoas acha que um é sinônimo do outro, quando, na verdade, são coisas completamente distintas. O grave, contudo, é que se associados são TNT pura, podendo, se detonada, já que é explosiva, causar estragos sem precedentes. O fato é que, isolado, o preconceito em si é até natural, não devendo, portanto, se tornar motivo para não importa qual polêmica nem, muito menos, se constituir num crime, passível, inclusive, de penalidades. Afinal, do latim praeconceptu, o substantivo preconceito nada mais é do que um conceito concebido previamente por motivações coletivas ou individuais em relação a algo, a alguém ou, até mesmo, a uma dada situação – conceito esse, aliás, que não deixa de ser um direito de todo e qualquer cidadão inserido na sociedade e até mesmo dos que são considerados excluídos dessa mesma sociedade. Discriminação não, já que, sendo um ato que estabelece diferenças, promove a segregação, seja ela ideológica, racial, social, religiosa, de credo etc. E é considerada crime, diferentemente do preconceito.
Quanto à entrevista mencionada no início do parágrafo anterior e publicada em agosto de 2010, identifiquei um equívoco já no título, ou seja, Marina: “Sofro preconceito por ser evangélica”, visto que na resposta da ambientalista a certa pergunta feita pelo jornalista sequer consta a palavra preconceito. Vejamos...
Rudolfo Lago: Seus adversários buscam colar na senhora a pecha de pessoa conservadora do ponto de vista dos costumes em razão da sua opção religiosa. Como a senhora responde a isso?
Marina Silva: Posso dizer que nunca fui discriminada por ser mulher ou negra, mas agora, pela primeira vez, estou sentindo um grande peso por ser evangélica. Quando os outros políticos se dizem contrários ao aborto, o assunto morre ali. Comigo, vira sabatina. Colocam-me rótulos de ultraconservadora, de fundamentalista, que não me cabem, pois não vivo à margem da modernidade. Você não imagina o mal-estar que isso me traz. Mas não vou mexer uma vírgula em meu discurso. Sou a favor da democracia e reconheço o grau de complexidade dessas questões. Por isso, eu as submeteria a um plebiscito.
Na verdade, o que Marina disse foi sentir “um grande peso por ser evangélica”. Obviamente que, por já no início da sua resposta ter dito que nunca foi “discriminada por ser mulher ou negra”, ela deu a entender passar por maus bocados em função da sua religião, aludindo, portanto, à discriminação. Aqui, contudo, um parêntese... Se o meu questionamento estiver parecendo bobagem para muitos, que o seja! Ocorre que, se a palavra preconceito não foi dita por Marina durante a entrevista, por qual motivo o jornalista a inseriu no título da entrevista? Isso sem falar que ele atribuiu à entrevistada a sua pronuncia! De repente, quem sabe, tudo não passou de um equívoco do entrevistador, mas se, no caso, por exemplo, há diferença entre preconceito e discriminação, nada mais coerente manter-se fiel aos fatos. Não é à toa que, na condição de jornalistas, temos o dever de divulgar uma informação tal qual ela nos foi passada, ou seja, imparcialmente, esclarecendo o leitor sobre não importa qual tema. E isso mesmo quando escrevemos um artigo, que, entretanto, difere de uma reportagem, bem como de uma entrevista – no artigo, podemos ser parciais. Enfim! Nada tão grave assim o equívoco – digamos – do jornalista, mas o suficiente para me instigar e refletir a respeito, sobretudo porque, no caso, reconheço que não me é simpático o fato de Marina ser evangélica, ainda mais da Assembleia de Deus, sobretudo porque, além de nutrir uma grande admiração pela pessoa humana que ela é, respeito enormemente a sua militância política e a sua atuação em prol de causas sociais e ambientais.
De qualquer modo, esse detalhe, ou seja, o fato de Marina ser evangélica – na verdade, sou avessa a toda e qualquer religião –, não me impediu de apoiar a sua candidatura e de votar nela nas últimas eleições presidenciais – e pretendo continuar votando –, já que, apesar dos meus preconceitos – quem não os tem que atire a primeira pedra –, não discrimino ninguém. Pelo contrário! Sinto até orgulho por fazer parte dos cerca de 20 milhões de eleitores que foram as urnas e votaram – no meu caso, conscientemente – na candidata Marina Silva. Tanto que continuo a apoiá-la e, sempre que aparece uma oportunidade, falo no meu blog e/ou fora dele da sua atuação como ambientalista e das conquistas que o movimento tem obtido planeta afora. Não obstante, gostaria de deixar registrada a minha perplexidade diante do fato dos seus adversários políticos – e não somente eles – terem, em 2010, quando da campanha eleitoral, considerado Marina uma “pessoa conservadora do ponto de vista dos costumes em razão da sua opção religiosa”, como mencionou o jornalista na entrevista citada nesta postagem. A meu ver, uma postura para lá de hipócrita, sem o menor cabimento, já que muitos – até mesmo os que militam em partidos de esquerda –, seguem outras religiões e nem por isso foram nem continuam sendo rotulados de conservadores em relação, no caso, aos costumes. Em minha opinião, os ataques nesse sentido contra Marina não passaram nem passam de um jogo sujo, de baixo calão. O curioso é que, se não estou enganada, a maioria dos presidentes do Brasil sempre rezou na cartilha da Igreja católica.
No quê, então – eu gostaria de saber –, a religião, no caso a católica, tem poder suficiente a ponto de influenciar nos mandatos presidenciais, mais especificamente os do Brasil, desde a instauração da República, em 1889, até os dias de hoje? Daí a discriminação contra Marina, amas apenas porque ela é evangélica? Além do mais, que eu saiba, além da opção por uma religião ser uma questão pessoal, de foro íntimo, não acredito que uma pessoa com a trajetória de vida como a de Marina iria, caso fosse eleita presidente do país, confundir a sua vida privada com a sua vida pública. A polêmica, por exemplo, criada em torno da descriminalização do aborto (sem falar que essa é uma polêmica desnecessária, pois é algo que só diz respeito à mulher que decide por um): por considerar o grau da sua complexidade, apesar de pessoalmente não ser favorável à interrupção de uma gravidez, Marina já deixou bem claro que cabe a um plebiscito nacional a decisão para a sua legalização ou não, ou seja, cabe ao povo brasileiro decidir se quer ou não descriminalizar o aborto. Outros dois exemplos de que Marina não é a ultraconservadora que muitos insistem em rotular? Além de ser favorável à união civil de homossexuais, a sua relação com a pesquisa científica, embora seja pessoalmente contrária à pesquisa com células-tronco embrionárias, “é de apoio e respeito total”, fazendo questão de lembrar que a legislação brasileira possibilita investimentos para a pesquisa. Porém, achando pouco, os seus adversários políticos e os quem pensam como eles são igualmente intransigentes quando se trata do empresário Guilherme Leal.
Dono da Natura, principal empresa brasileira de cosméticos, o empresário Guilherme Leal foi o escolhido por Marina para ser o seu vice quando da sua candidatura nas eleições presidenciais de 2010. Ora! Empresário por empresário, o vice de Lula – e durante os longos e tenebrosos oito anos dos seus dois mandatos – também o foi, ou seja, José Alencar (1931 - 2011), sendo a Coteminas a principal empresa do império que construiu no ramo têxtil. No caso do primeiro, segunda as palavras da própria Marina: “há pessoas que, arrebatadas pela proximidade do poder, entram na política arrombando a porta. Guilherme Leal é daquelas que pedem licença”, sendo, ainda, um dos fundadores e membro do Conselho Deliberativo do Instituto Ethos, ex-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade - Funbio e ex-integrante do Conselho Consultivo da WWW Brasil, tendo, portanto, uma marcante presença na trajetória do ativismo socioambiental brasileiro. Sei não, mas, dá para comparar um com o outro? Enfim! Na semana passada, como era de se esperar – nenhuma surpresa –, Marina foi classificada como um dos três finalistas da categoria Personalidade do Ano de 2012 da segunda edição do GreenBest, que premia personalidades, empresas e todos os projetos sociais voltados para a promoção da sustentabilidade. Este ano, os vencedores de todas as categorias serão anunciados no dia 15 de maio, dentre os quais um receberá o Grand Prix. No ano passado, a vencedora foi Marina Silva. Em discurso proferido à ocasião, a ambientalista disse:
— Este prêmio é mais um reconhecimento de que a nossa sociedade definitivamente colocou em sua agenda o tema do desenvolvimento sustentável. São milhões de brasileiros que consideram a preservação de nossos recursos naturais estratégica para a promoção da expansão econômica do país. Esses consumidores, hoje, sabem que economia e ecologia devem fazer parte da mesma equação.
— Este prêmio é mais um reconhecimento de que a nossa sociedade definitivamente colocou em sua agenda o tema do desenvolvimento sustentável. São milhões de brasileiros que consideram a preservação de nossos recursos naturais estratégica para a promoção da expansão econômica do país. Esses consumidores, hoje, sabem que economia e ecologia devem fazer parte da mesma equação.
Então, será que já não está na hora de, ao invés de discriminar, descriminalizar Marina Silva?
Nathalie Bernardo da Câmara
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