terça-feira, 3 de abril de 2012


UM PASSO MAIOR DO QUE A PERNA...


“É nas bibliotecas que se cura a ignorância, a mais perigosa das enfermidades e a origem de todas as outras...”.

Jacques-Bénigne Bossuet (1627 – 1704)
Teólogo francês


Ela já foi chamada de a biblioteca sem livros, visto que, após a sua inauguração, no dia 15 de dezembro de 2006, a Biblioteca Nacional de Brasília - BNB permaneceu durante muito tempo sem acervo e fechada à visitação. O que dirá à pesquisa! As más línguas, contudo, costumam dizer que o seu único mérito é o de ter sido projetada pelo arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer. Tanto que, como todas as demais obras do mestre do concreto armado, ela não deixa de ser monumental. Isto é, no sentido arquitetônico da palavra. Ocorre que, nesta segunda-feira, 2, a CBN denunciou: Biblioteca Nacional de Brasília sofre com deterioração. Segundo a ainda a rádio que toca notícia – slogan da emissora –, a BNB anda a passar por um período periclitante, já que, entre outros reveses, a sua manutenção é considerada precária, com elevadores quebrados, banheiros impróprios e equipamentos de ar condicionado sem funcionar, deflagrando, portanto, não um leque, mas uma bandeira de obstáculos para todos aqueles que a visitam, embora, sobretudo, para os pesquisadores. Desse modo, não é de se estranha que o único compromisso da BNB tem sido – tudo indica – com o descaso das autoridades – ditas competentes – que deveriam zelar pela integridade física de um dos mais recentes patrimônios públicos do país. Isso sem falar na limitação do acervo da instituição, que, desde a sua abertura à visitação e à pesquisa, quase dois anos depois da sua inauguração, ou seja, no dia 12 de dezembro de 2008 – há pouco mais de quatro anos – até os dias de hoje, nunca foi lá grande coisa e carece de novos títulos.

Sei não, mas, em minha opinião, desde que começaram a ventilar a iminência das obras da BNB, sempre achei desnecessária essa necessidade de Brasília ter porque ter uma biblioteca do porte da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro - BN, que, aliás, fundada oficialmente no dia 29 de outubro de 1810, embora a pedra fundamental da atual edificação tenha sido lançada apenas no dia 15 de agosto de 1905 e a sua inauguração date de 29 de outubro de 1919, além de ser uma referência nacional, é considerada pela UNESCO como uma das dez maiores do mundo e a maior da América Latina. Falando nisso, quando pesquisei a respeito da história da BN, em função de uma postagem que pretendia escrever e postar, eu inclusive descobri que até padroeiro os bibliotecários têm, ou seja, São Jerônimo (347 - 419/420) – a sua canonização deu-se em 1767 –, que, quando vivo, chegou a possuir a mais importante biblioteca da Roma Antiga. De repente, quem sabe não séria uma ideia apelar para o santo em questão e pedir que ele proteja a BNB, cujos primeiros passos dados no sentido da sua edificação remonte, nada mais nada menos, ao dia 27 de abril de 1962, quando o então presidente do Conselho de Ministros, o advogado Tancredo Neves (1910 - 1985), publicou um decreto, de nº 927-A, através do qual uma comissão foi constituída para estudar as medidas necessárias para a sua criação, organização e instalação, considerando, no caso, que a capital do país não poderia prescindir de uma biblioteca nacional.

A meu ver, contudo – sem questionar os méritos da iniciativa do saudoso Tancredo –, acho que, com o passar do tempo, o sonho por ele alimentado já era suprido pela BN, que, de há muito, cumpre exemplarmente o seu papel, se resumindo a BNB numa obra que nem deveria ter sido pensada. O que dirá edificada! Infelizmente, após a derrocada da ditadura militar no Brasil (1964 - 1985), o então presidente da República, o advogado José Sarney – só podia ser –, inventou de desenterrar o passado e, no dia 10 de fevereiro de 1988, instituiu uma comissão especial com a finalidade de tomar as devidas providências para a implantação de um conjunto cultural, incluindo uma biblioteca nacional, a fim de viabilizar a conclusão da estrutura básica de Brasília. Assim, com o tempo novamente a passar, outras medidas foram tomadas por autoridades outras para que, um dia, Brasília viesse a ter a sua biblioteca nacional, no caso, a BNB, cuja criação, aliás, não passou de veleidades ocasionais, de dispensáveis caprichos políticos. Enfim! O que antes era apenas um sonho passou para o papel e, posteriormente, apesar de capenga, se tornou uma realidade, ou seja, passou do direito ao fato, o que é lamentável, sobretudo considerando o impropério que é querer transformar a BNB no santuário máximo do saber no país em detrimento da BN, que, queiram ou não, já detém esse status. E só sabe disso quem, um dia, já cruzou, por exemplo, o umbral da sua porta principal e, dentre outros privilégios, conheceu o seu setor de obras raras – acesso esse, inclusive, raro para a maioria dos mortais...


Nathalie Bernardo da Câmara

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