GREENWAR*
Por Mario Moscatelli
Biólogo e ecologista brasileiro
Diferentemente daquela visão romântica dos anos 70 durante os quais o movimento ambientalista normalmente era associado ao “paz e amor”, muita maconha e “fiscais da natureza”, sem muito o que fazer, o que vem por aí terá muito pouco a ver com o famoso e lúdico Greenpeace. A Greewar, literalmente, vai pipocar nos próximos anos, não só pela biodiversidade de valor incalculável, mas também por recursos bem mais básicos, exemplo a água.
Alguma novidade? Nenhuma, pelo menos se você tiver dois neurônios e estiver usando apenas um deles. Mas o que mais chama a atenção é que diferentemente das profecias do fim do mundo, o mundo já está definhando, e muito rapidamente, enquanto economias do Primeiro Mundo afundam na incompetência administrativa da classe política de lá, outra merda, muito parecida com a daqui.
Não tem jeito, o que manda é o bem-estar, e esse papo de ideologia é bonitinho quando você está com a barriga cheia no “bem-bom”, mas o que manda mesmo no fim das contas, como dizia meu bom pai italiano, é a barriga cheia e, além disso, poder consumir à vontade. Qualquer governo de qualquer linha ideológica, se não gerar bem-estar para a população, pode esperar que um dia vai levar uma rasteira, seja por bem, democraticamente, ou por mal, via confronto até a guerra civil.
Se estiver todo mundo de barriga cheia, pode ter certeza de que as “auturidadis” podem cometer os maiores desatinos, tortura, superfaturamento, roubalheira, desaparecimento, genocídio, que, dependendo das circunstâncias, tudo deverá ser bem justificado por quem executa as arbitrariedades diante de uma plateia satisfeita, e portanto muito bem comportada. A natureza humana é assim. Neste contexto do famoso “pouca farinha, meu pirão primeiro” enquanto “governos” falam em bilhões, trilhões de dólares, ou euros para socorrer as economias moribundas, o futuro do planeta parece coisa para quem não tem o que fazer.
Do jeito que as negociações do clima andam, para trás e para os lados, a previsão até pouco tempo pessimista vai se apresentando como a mais realista, em que ano após ano batemos os recordes de emissão de gases associados com o aquecimento global e a acidificação dos oceanos. Pois então, preparem-se para o que irá acontecer, no meu entender de forma otimista, até 2100, com o incremento de três a quatro graus centígrados acima do nível pré-industrial:
— Liberação de CO2 e do metano congelados no fundo dos oceanos e no permafrost (solos congelados situados nas regiões polares);
— 50% de risco de colapso da circulação de correntes do Oceano Atlântico (regulador do clima);
— Aumento de 5% a 8% das áreas áridas e semiáridas da África;
Neste contexto, espera-se a elevação do nível do mar em um metro até 2100. Só que tem mais.
— Risco de desintegração da Plataforma de Gelo Oeste da Antártica, o que significaria mais três metros de elevação dos oceanos com consequências dramáticas;
— Risco de 60% de degelo da calota da Groenlândia, o que elevaria o mar em mais cinco metros;
— Declínio de todas as culturas da África;
— Redução das geleiras continentais, com impactos na Ásia e na América do Sul;
— Corais de recifes começam a se dissolver devido ao aumento da acidificação e da temperatura dos oceanos;
— Risco de extinção global de 40% a 70%;
— Morte das florestas boreais e morte em massa das árvores da Amazônia.
Tá bom ou quer mais? Realmente, quem ainda estiver por aqui vai ficar com inveja dos mortos, como já diziam aquelas passagens bíblicas.
Mas convenhamos: isso está muito longe de nosso dia a dia, a não ser quando desabam os morros, a cidade fica debaixo dágua e tudo logo, logo, volta à “anormalidade” de sempre, e daí lá vamos nós para mais desastres.
Tem mais. Se os países emergentes (Brasil, China e Índia) almejarem ter a tão desejada american life way, dentro da ótica dominante em que a economia de uma forma geral é baseada firmemente no consumo e no crescimento sem limites dentro de um planeta de recursos limitados, infelizmente, a mãe Terra apenas não vai dar conta da voracidade suicida de seu filho pródigo. Como por enquanto a tecnologia disponível não nos permite nem ao menos fixar-nos na Lua, é bom pensarmos qual Kraken ambiental estamos querendo acordar nos próximos vinte e cinco anos.
Já ocorreram extinções há 240 e 65 milhões de anos atrás, e mais uma ou menos uma para a história da vida neste planeta não irá fazer muita diferença. Contudo, tenho profunda pena das crianças e dos demais organismos não humanos que irão pagar a conta de tanta miopia e ganância patológica.
Mas como sempre digo, vai ver que estou exagerando, e tudo o que eu vejo e sinto são apenas delírios de um biólogo que trabalha no UTI do meio ambiente da região metropolitana do Rio de Janeiro, e no final tudo vai dar certo. Basta saber, porém, para quem é que vai dar certo mesmo.
*Publicado no Jornal do Brasil no dia 08 de março de 2012, ressaltando que a ilustração e a epígrafe foram escolhas minhas.
Quero o meu ambiente por inteiro!
Não pela metade...
Nathalie Bernardo da Câmara
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